#AgripinodoMilhao: Operação Sinal Fechado na CartaCapital: um milhão para Agripino

Por Leandro Fortes



Revelado na quarta-feira 9 pelo site de CartaCapital, o conteúdo do depoimento do lobista Alcides Fernandes Barbosa ao Ministério Público do Rio Grande do Norte mexeu com os nervos da política potiguar e levou a crise a Brasília. Barbosa, após celebrar um acordo de delação premiada com os promotores em Natal, acusou o senador José Agripino Maia, presidente do DEM, de ter recebido 1 milhão de reais de um esquema criminoso desbaratado no ano passado.

O lobista foi preso durante a Operação Sinal Fechado, em 24 de novembro de 2011, que teve como alvo a atuação do Consórcio Inspar, montado por empresários e políticos locais com a intenção de dominar o serviço de inspeção veicular no Rio Grande do Norte por 20 anos. A quadrilha pretendia faturar cerca de 1 bilhão de reais com o negócio. Além de Barbosa, houve outras nove prisões. Ao todo, 34 suspeitos foram denunciados por formação de quadrilha, peculato, corrupção passiva, tráfico de influência, dispensa ilegal de licitação e fraude em licitação. Entre eles, dois ex-governadores, ambos do PSB: Wilma de Faria e Iberê Ferreira.

O depoimento de Barbosa durou 11 horas e reforçou muitas das teses levantadas pelos promotores sobre a participação de políticos no bando montado pelo advogado George Olímpio, apontado como líder da quadrilha, que permanece preso em Natal. De acordo com trechos da delação, gravada em vídeo, Barbosa afirma ter sido chamado, no fim de 2010, para um coquetel na casa de Maia para conhecer pessoalmente o presidente do DEM.

O convite teria partido de João Faustino Neto, ex-deputado, ex-senador e atual suplente de Maia no Senado. Segundo o lobista, ele foi chamado ao encontro por causa da ausência inesperada de outros dois paulistas, um identificado por ele como o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB) e o outro apenas como “Clóvis”- o MP acredita tratar-se do também tucano Clóvis Carvalho, ex-ministro da Casa Civil do governo Fernando Henrique Cardoso. Acusado de ser um dos principais articuladores do esquema criminoso no estado, Faustino Neto foi subchefe da Casa Civil do governo de São Paulo durante a gestão do tucano José Serra. À época era subordinado a Nunes Ferreira.

O parlamentar paulista afirma jamais ter sido convidado para qualquer evento na casa de Maia. O tucano admite que possa, em algum momento, ter sido apresentado a Barbosa em São José do Rio Preto, onde nasceu e tem base eleitoral. “Mas não o reconheceria se o visse no elevador”. Ferreira conta que há três meses foi procurado por uma advogada de Santos que lhe pediu para interceder a favor de Barbosa, sob a alegação de que o lobista estava muito doente na prisão. “Ela falou que era uma questão humanitária e pediu a minha ajuda porque somos (ele e Alcides) da mesma região”. Mas o senador alega não ter tomado nenhuma atitude. “Não tenho nada a ver com essa história”.

O papel de Barbosa na quadrilha, dizem os promotores, era evitar que a Controlar, empresa com contratos na prefeitura de São Paulo, participasse da licitação que resultou na escolha do Consórcio Inspar. Em conversas telefônicas interceptadas com autorização da Justiça potiguar, Barbosa revela ter ligado para o prefeito Gilberto Kassab (PSD) em 25 de maio de 2011, quando se identificou como responsável pela concessão da inspeção veicular no Rio Grande do Norte. Aos interlocutores, o lobista garantiu ter falado com o prefeito paulistano e conseguido evitar a entrada da Controlar na concorrência aberta pelo Detran local. Em um dos telefonemas, afirma ter tido uma conversa “muito boa”.

Aos promotores, Barbosa revelou ter sido levado ao “sótão”do apartamento do senador Maia, em Natal, onde garante ter presenciado o advogado Olímpio negociar com o parlamentar um apoio financeiro à campanha de 2010. Na presença de Faustino Neto e Barbosa, diz o lobista, Olímpio prometeu 1 milhão de reais ao presidente do DEM. O pagamento, segundo o combinado, seria feito em quatro cheques do Banco do Brasil, cada qual no valor de 250 mil reais, a ficarem sob a guarda de um homem de confiança de Maia, o ex-senador José Bezerra Júnior, conhecido por “Ximbica”. Maia queria o dinheiro na hora, afirma Barbosa, mas o advogado teria alegado somente poder iniciar o pagamento das parcelas a partir de janeiro de 2011.

O depoimento de Barbosa reforça um outro, do empreiteiro potiguar José Gilmar de Carvalho Lopes, dono da Construtora Montana e, em consequência, apelidado Gilmar da Montana. Preso em novembro de 2011, o construtor, em depoimento ao Ministério Público, revelou que o tal repasse de 1 milhão de reais ao senador era “fruto do desvio de recursos públicos” do Detran do Rio Grande do Norte. O empresário contou história semelhante à de Barbosa. Segundo ele, Olímpio deu o dinheiro “de forma parcelada” na campanha eleitoral de 2010 a Carlos Augusto Rosado, marido da governadora Rosalba Ciarlini (DEM), e para o senador. E mais: a doação foi acertada “no sótão do apartamento de José Agripino Maia em Morro Branco (bairro da capital)”.

Barbosa diz ter havido ainda outro encontro entre ele e Maia, dessa vez em Brasília, onde o senador mantém uma casa. Na oportunidade, estavam presentes Faustino Neto e Olímpio. Ele narra aos procuradores: “João Faustino estava muito preocupado, porque George estava falando já desses cheques para Natal inteira”. Segundo Barbosa, a intenção de Olímpio era deixar claro que os cheques eram uma garantia de que o esquema seria implantado sem demora no estado. Por causa disso, Agripino não queria mais receber George em Natal.

No encontro de Brasília, revela Barbosa, o senador avisou ao advogado que devolveria os dois últimos cheques, uma vez que os dois primeiros, no valor total de 500 mil reais, haviam sido descontados. Na versão do lobista, o senador do DEM decidiu devolver o dinheiro em razão de um desentendimento com a governadora Rosalba Ciarlini e o marido dela.

Maia teria dito a Olímpio que fazia a devolução por não poder “ir além” nas negociações com o casal. “Não vou romper politicamente com Carlos Augusto (Rosado) e com a Rosalba (Ciarlini) em virtude desse compromisso”, teria avisado o presidente do DEM, segundo o lobista. Quanto aos dois primeiros cheques descontados, referentes a janeiro e fevereiro de 2011, o senador não teria revelado a destinação. “Você me dá uns dez, 15 dias que eu vou conversar com você para ver”, teria dito o parlamentar ao acusado de chefiar a quadrilha. Mas o dinheiro nunca teria aparecido.

Com base em ambos os depoimentos, o Ministério Público potiguar decidiu encaminhar o assunto à Procuradoria-Geral da República, uma vez que Maia tem direito a foro privilegiado. Caberá ao procurador-geral, Roberto Gurgel, decidir se uma investigação será aberta ou não.

A CartaCapital, o senador negou todas as acusações. Disse que o tal coquetel em seu apartamento nunca aconteceu, muito menos o acerto do tal repasse de 1 milhão. Negou até possuir um sótão em casa. “Sótão é aquela coisinha que a gente sobe por uma escadinha. No meu apartamento eu tenho é uma cobertura”. Maia afirma ser vítima de uma armação de adversários políticos e se apoia em outro depoimento de Gilmar da Montana, em que ele nega ter participado do coquetel na residência do senador.

De fato, dias depois de o depoimento do empreiteiro ter vazado, no fim de março, o advogado José Luiz Carlos de Lima, contratado posteriormente à prisão de Gilmar da Montana, apareceu com outra versão. Segundo Lima, houve “distorções” das declarações de seu cliente. O depoimento prestado a dois promotores e a uma advogada dentro do Ministério Público, alegou o defensor, ocorreu em condições “de absoluto estresse emocional e debilidade física” do acusado, que estaria sob efeito de tranquilizantes. No MP potiguar, a versão não é levada a sério.

Um dos principais objetivos do esquema de pagamentos de propina, insistiu Barbosa, era articular com a então governadora Wilma de Faria a implantação da inspeção veicular obrigatória no estado. Para essa missão, o filho de Wilma, Lauro Maia, receberia 10 mil reais por mês de Olímpio. O dinheiro provinha da arrecadação da Central de Registros de Contratos (CRC), que funcionava como uma espécie de cartório para autenticação de todos os processos de veículos financiados, em transferência ou alienados no estado. Lauro Maia é velho conhecido da crônica policial potiguar. Em 2008, foi preso durante a Operação Hígia, da PF, acusado de desviar 36 milhões de reais do sistema público de saúde local.

Barbosa informou ainda que Olímpio teria pago 300 mil reais ao deputado estadual Ezequiel Ferreira de Sousa (PTB) para elaboração e aprovação da lei que instituiu a inspeção veicular obrigatória no Rio Grande do Norte, em agosto de 2009. Segundo o lobista, o ex-governador Iberê Ferreira teria participado do esquema e seria beneficiário de 15% de toda arrecadação feita pela quadrilha. Mesmo porcentual a que teria direito a ex-governadora Wilma de Faria. A João Faustino Neto, diz Barbosa, caberia um naco menor, de 10%.

Os acusados negam a participação no esquema.


Nota do blog:  Aloysio Nunes Ferreira veio visitar João Faustino na prisão nos primeiros dias depois da Operação Sinal Fechado.  Ferreira também é testemunha arrolada pela defesa de George Olímpio.  Aí tem.

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