Operação Assepsia: Esquema se repetia no Hospital da Mulher



Isaac Lira, Marco Carvalho e Ricardo Araújo




Uma das empresas investigadas pelo Ministério Público Estadual na Operação Assepsia por fraudes na Secretaria Municipal de Saúde tem contrato com a Associação Marca no Hospital da Mulher de Mossoró. A Salute Sociale - empresa de propriedade de três pessoas presas na última quarta-feira: Tufi Meres, Rose Bravo e Antonio Carlos de Oliveira Júnior - é fornecedora de mão de obra do Hospital da Mulher, tendo recebido somente em abril R$ 1,9 milhão por disponibilizar de 270 funcionários da unidade de saúde. A Marca foi contratada pelo Governo do Estado e, por sua vez, subcontratou a Salute Sociale. Trata-se do mesmo procedimento utilizado na Secretaria Municipal.




A informação dos repasses e do subcontrato da Salute com a Marca estão presentes na prestação de contas da Organização Social no mês de abril, a qual a TRIBUNA DO NORTE teve acesso. O documento, enviado pela diretora geral da Marca Elisa Andrade de Araújo à Maria Bularmaqui, que é a gestora do Fundo Estadual de Saúde no último dia 11 de junho, traz todos os gastos da Marca nos primeiros meses da parceria, incluindo uma série de despesas contraídas antes da assinatura do contrato com a Secretaria Estadual de Saúde. Lá estão descritas todas as empresas subcontratadas pela Marca para prestarserviços ao Hospital da Mulher, entre elas a Salute Sociale.

Na prestação de contas, há a lista de funcionários contratados pela Salute para prestação de serviços ao Hospital da Mulher através da Marca.

Com relação ao mês de abril, são 270 funcionários, segundo a lista enviada pela Marca, entre profissionais de nível superior e médio. São psicólogos, farmacêuticos, fisioterapeutas, técnicos em enfermagem, vigias, entre outros. Os funcionários, ainda de acordo com os documentos aos quais a TRIBUNA DO NORTE teve acesso, foram admitidos somente após a assinatura do contrato entre a Marca e o Governo do Estado.

A ligação entre a Marca e a Salute ganhou várias páginas na petição do Ministério Público Estadual sobre as supostas fraudes na Prefeitura de Natal. Essa proximidade é tamanha que os promotores chegam a dizer que as duas são a mesma entidade. As duas dividem inclusive a mesma sala como sede, de acordo com o texto do Ministério Público Estadual. Os "cabeças" de ambas, tanto da Marca quanto da Salute, são Tufi Meres, Rose Bravo e Antonio Carlos de Oliveira Júnior, considerados os principais nomes das supostas fraudes, junto do procurador Alexandre Magno Alves.

Além disso, a "função" da Salute no divulgado esquema é justamente o fornecimento de mão de obra. "Na prática, a Marca representa um grupo de empresas que acompanham cada gestão da referida OS. Na verdade, trata-se de um grupo criminoso, que através da Marca e da entidade Salute Sociale e de outras empresas satélites, desviam dinheiro público, mediante a inserção de despesas fictícias nas prestações de contas.

Quando o poder público contrata uma, as outras vêm junto no pacote contratado", relatam os promotores. De fato, são semelhantes os procedimentos suspeitos na Secretaria Municipal de Saúde e a forma como a Salute passou a prestar serviço ao Hospital da Mulher. Como se sabe, para o MPE, as organizações sociais investigadas são apenas "fachada" para a contratação de empresas ligadas aos próprios diretores dessas O.S.s de forma mais "flexível". "A contratação da Marca por parte da SMS não se restringiu apenas a esta OS, mas englobava um pacote de outras empresas do esquema ilícito (SALUTE SOCIALE, MEDSMART, HEALTH SOLUTIONS LTDA e outras empresas), que foram contratadas para prestar serviços ao Poder Público Municipal através da Marca, sem ter que se submeter a um processo licitatório, através da burla à lei de licitação prevista pela contratação das OS´s", argumenta a petição.
 
Outra semelhança, dessa vez fartamente descrita na petição do MPE, é a parceria do procurador municipal Alexandre Magno, que foi cedido do Município para o Estado e atuou, segundo o ex-secretário de Saúde, Domício Arruda, como consultor, "em vários contratos", incluindo o da Marca.

Procurador era assessor da Secretaria Estadual de Saúde

Embora não seja objeto da Operação Assepsia, os promotores do Patrimônio Público dedicaram alguns trechos da petição que serviu como base para prender seis pessoas e realizar várias apreensões de documentos ao início da utilização de organizações sociais na Secretaria Estadual de Saúde. O início desse processo se confunde com a cessão do procurador municipal Alexandre Magno Alves para a Secretaria Estadual de Saúde, no dia 16 de setembro de 2011, pelo período de um ano. O procurador já foi "devolvido" ao Município.

Para entender o contexto dessa cessão, é preciso observar a forma como a petição do MPE cita o fato, tendo como base interceptações telefônicas entre o ex-secretário municipal de Saúde e o próprio procurador: "o objetivo da presença de ALEXANDRE MAGNO na Secretaria Estadual de Saúde é unicamente viabilizar a contratação de organizações sociais do terceiro setor para administrar recursos públicos destinados à área de saúde". O procurador trabalhou de setembro do ano passado a junho deste ano com atuação direta junto ao secretário de Saúde.

Em contato com o ex-secretário Domício Arruda, gestor à época, a reportagem confirmou o motivo da cessão. "Tínhamos carência de assessores jurídicos na Sesap e o procurador do Município tinha experiência no assunto. Ele deu consultoria em vários contratos", explica Domício Arruda, acrescentando que não teve acesso a nenhuma prestação de contas da Marca e que à época da contratação não havia nenhuma suspeita sobre a OS. "Fizemos um convite à Marca porque era a única que estava atuando no Estado e o nosso contrato é diferente do contrato do Município, porque a Marca não gere um hospital público, mas um hospital privado, que foi alugado e montado no perfil desejado pela Secretaria", acrescenta.

Há uma outra interceptação, dessa vez com uma conversa entre o próprio Domício Arruda e Alexandre Magno Alves. Lá, o ex-gestor estadual da Saúde diz, no dia 28 de junho de 2011, que a governadora Rosalba Ciarlini queria "alugar o Hospital da Unimed em Mossoró e transformá-lo numa unidade materno-infantil".

Mais uma gravação telefônica, dessa vez entre uma das controladoras da Marca, Rose Brava, supostamente demonstra, para os promotores, que houve direcionamento à OS que já atuava no Município de Natal. Na conversa, uma interlocutora identificada como Fabrícia fala com Rose sobre a possibilidade de a Marca atuar em Mossoró. "Salta aos olhos, então, o direcionamento conduzido por ALEXANDRE MAGNO para que a entidade do terceiro setor a ser contratada pelo Estado seja a Marca, a mesma entidade que ele ajudou a se instalar no Município de Natal", avalia.


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