De uma forma ou outra havia o Diário de Natal no meio do Caminho

Por Marcos Dionísio Medeiros Caldas
Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos


A primeira vez que eu ouvi falar do DN foi através dos berros de um vendedor de Jornais que a gente chamava de Alberís, numa alusão ao craque que infernizava a vida dos americanos e que, circulava vendendo-o pelo grande ponto e concluía as vendas na parada Metropolitana onde moravam meus avós. ALBERÍS gritava de um jeito engraçado, cheio de manha, chiando e fazia a meninada rir anunciando a plenos pulmões as manchetes.
Ainda menino, também aprendi a ler soletrando os verbetes que eram publicados dos dois lados do título na capa do Diário de Natal, retransmitindo notícias de agências internacionais. Esperava meu pai voltar dos Correios trazendo o Diário.
Lembro bem das notícias sobre a guerra do Vietnã.
Pelo ano de 77, fui entrevistado pela primeira vez na vida sobre uma anunciada greve de taxistas. Quem colheu minha opinião foi Osni Damásio. A matéria me rendeu muitos elogios de professores na ETFRN, dos amigos de Candelária e puxões de orelhas em casa, do meu pai, sempre traumatizado pelas agruras sofridas pelo seu primo Geraldo Caldas nos tempos mais obscuros do golpe militar. “E eu rebatia meu pai, dizendo que eu só afirmara ‘que se era o momento de transformar o Brasil numa Democracia, não se podia negar aos taxistas o seu direito de greve”. E papai tinha um Taxi para se virar nas folgas dos correios.
Depois, já na UFRN, roía as unhas de raiva com as matérias reacionárias que o Diário de Natal republicava da fonte do Estadão, achincalhando tudo que era pensamento democrático, liberal ou de esquerda. Algumas daquelas matérias eram pura esquizofrenia. Só depois vim, a saber, “as razões”.
No Movimento Estudantil, tivemos contato com jornalistas, fotógrafos e repórteres do Diário e a convivência era amena, mesmo no período da ocupação da Reitoria, onde aqui e acolá surgia uma provocação menos amena. Adorava a cobertura dada pelo Diário aos Festivais de Música e poesia.
Também desta época, fica a lembrança da cobertura da Campanha das Diretas e depois da vitória de Tancredo. Este tempo trás também a triste memória do acidente do baldo que ceifou vidas e adiou um grande comício que haveria no sábado na Gentil Ferreira. Páginas igualmente tristes foram as que trouxeram fotos de minha colega de curso Lígia Rego e da minha cunhada Ceres Pinheiro, sem vidas, em meio à dor. Chocantes.
Depois, já como Ouvidor da Secretaria de Segurança e posteriormente, como Coordenador Estadual de Direitos Humanos, sempre encontrei no Diário, aliados às nossas lutas pelos Direitos Humanos, antes, através de notas, matérias e comentários de Carlos Magno, Dionisio, Rafael, Gabriela , Sérgio Villar, Moisés Albuquerque e Cassiano. Já recente pelos textos dos Paulos, Erta, Juliska , Moisés e Aluízio Lacerda.
Dionísio e Carlos Magno davam-me muita corda e era com prazer que eu ia pessoalmente entregar os textos para Ponto e Contraponto e lá sempre tinha um papo instigador e ameno, sempre concluído com provocações entre abecistas e americanos.
Não lembro a data exata da primeira diáspora dos jornalistas do Diário de Natal, quando foram desligados Carlos Magno Araújo, Osair, Dionisio Outeda, Albimar e tantos outros. Mas lembro de que fiquei muito chocado e como a Coordenadoria de Direitos Humanos ficava colado ao Diário, na Avenida Deodoro , aqueles dias, foram dias sombrios. Na verdade, agora, sabe-se, o próprio DN morria ali. Depois foi só um período de sobrevivência, no exato conceito de sobrevivência, bem clivado pelo Chefe Seattle em seu célebre discurso.
Hoje pela manhã, impactado com a notícia, saí a tuitar sem saber da missa um terço. Achava que poderia ser só uma acomodação ou mesmo uma reengenharia administrativa que é como os gênios neoliberais chamam o trucidamento de postos de trabalho. Mas era mais. Era morte do Diário de Natal com requintes de perversidade na forma como foi anunciada e preparada de modo que os seus próprios responsáveis ficassem sabendo através de amigos.
No Dia Internacional da Não Violência, a empresa dos Diários Associados, sem nenhuma elegância e de maneira Maquiavélica querendo fazer o mal de uma só vez, rompeu vínculos trabalhistas, decretou a morte da edição impressa e com requintes quem sabe de sadismo pôs na nota anunciadora que o fazia “para ampliar a nossa versão eletrônica. Nesse sentido, estamos dando mais ênfase à internet e também às rádios” E mais que “Tal decisão, aliás, se enquadra na tendência, de amplitude internacional, de se alargar, cada vez mais, as opções eletrônicas, graças aos formidáveis avanços tecnológicos”.
Tanta deselegância me faz sempre lembrar da frase mais célebre do humorista Golias: A CIVILIZAÇÃO NÃO SE COMPORTOU! Mais uma vez! Minha Solidariedade e Longa vida aos que fizeram o Diário de Natal. Vida que segue, como diria João Saldanha.

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