O Egito se agita ante um novo faraó

Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu


É virtualmente impossível capturar, em imagens, o tumulto de uma revolução – especialmente a revolução no Egito, que prossegue, sem final à vista. Está em curso outra revolução dentro da revolução.

Os cinegrafistas chineses capturaram visuais fantásticos, com as margens do Nilo outra vez agitadas pelas ininterruptas paixões humanas.  O álbum de fotos da rede Xinhua pode ser visto em http://news.xinhuanet.com/english/photo/2012-11/24/c_131995566.htm.

O Egito se agita. O país está rachando. A esquerda, virou direita. A Fraternidade Muçulmana, o azarão vencedor, tornou-se establishment. E uma Nova Esquerda apareceu, incluindo, paradoxalmente, os centristas, liberais, secularistas e esquerdistas de estilo ocidental – todo mundo, de fato; exceto os islamistas.

Aparentemente, a questão é o movimento autoritário que, pelo que se diz, marcaria o recente decreto assinado pelo presidente Mohamed Morsi, que o torna imune à corte constitucional, no momento em que o Egito está às vésperas de dar o importante passo de redigir uma nova constituição. O grande medo é que os islamistas estejam empurrando a maioria silenciosa para o total alinhamento.

É perigo real. Até um liberal como Mohammed ElBaradei já chamou Morsi de "um novo faraó". Mas Morsi não dá sinais de remorso. É raposa esperta, que já conjurou os militares e os vestígios remanescentes da era Mubarak, essa semana, no desempenho que teve na questão de Gaza, demonstrando a Washington que pode servir aos interesses ocidentais na região, com mais efetividade e mais credibilidade que qualquer outro, no Egito.

Morsi converteu o conflito de Gaza em jogo de xadrez político-diplomático de primeira classe. Alcançou acordo que traz alívio aos EUA e a Israel. Mas enquanto o ferro ainda está quente, age também para consolidar-se no poder, quando assinou o catastrófico decreto, calculando que, hoje, nada tenha a temer dos militares pró-EUA e do aparelho de segurança.

Para o governo Barack Obama, Morsi tornou-se presente caído do céu: é voz legítima, democraticamente eleito, preparado para subservir a agenda dos EUA. E, além do mais, é islamista. O exemplo de Morsi como colaborador encoberto encoraja Washington a ajudar os Irmãos da Fraternidade Muçulmana a assumir o comando também na Síria – e na Jordânia, Inshah Allah.

Morsi, de fato, trabalhou excepcionalmente bem. Conseguiu até o pacote de resgate do FMI, de $4,2 bilhões, para a economia egípcia – com os cumprimentos de Obama, claro. E tem também o presentinho de $2 bilhões de dólares de cada lado, do Qatar e da Turkey. Só os sauditas mantêm-se a uma distância suspeitosa.

Mas, para consolidar-se, Morsi tem de, antes, livrar-se do desafio barulhento da Nova Esquerda. Como fará, ainda falta ver. Haverá sangue em suas mãos, no final de tudo?

Tudo isso gera tempos de alta ansiedade também para o governo Obama. Obama precisa saber logo, mais uma vez, qual é "o lado certo da história" no Egito. Morsi é grande dádiva – preciosa demais para deixar escapar. Por outro lado, se Morsi vencer decisivamente o round em curso da revolução dentro da revolução na Praça Tahrir, o islamismo estará incontenivelmente em marcha na região. A ironia disso tudo é que Morsi, nesse caso, terá esmagado irreparavelmente todo o eleitorado que se esperaria que fossem os "aliados naturais" dos EUA – os liberais, os centristas, os secularistas, etc.


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