A verdade sobre Aluízio Alves

Parte da história relatada abaixo se evidencia no Relatório Veras, recentemente lançado em Natal.

Por Gustavo Barbosa

“O que Aluízio Alves teve daquele processo revolucionário foi uma violenta cassação, mas graças a Deus e a força dele, eu e Garibaldi Filho pudemos continuar a sua luta e os seus ideais”, disse o deputado Henrique Eduardo Alves em sessão solene realizada no dia 06 de dezembro na Câmara dos Deputados que simbolicamente devolveu o mandato de 173 parlamentares que tiveram seus direitos políticos cassados durante o regime militar que durou de 1964 a 1985.

A historiografia costuma colocar o ex-governador Aluízio Alves como opositor à ditadura militar, vez que, principalmente, foi membro do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), agremiação que representava o contraponto à Aliança Renovadora Nacional (ARENA), partido de sustentação do então regime militar. Sua perseguição pelos militares seria, assim, a inconteste prova da sua luta. Pura falácia.

Primeiro, pelo fato de com o passar dos anos o ímpeto ditatorial ter perdido o controle quase que por completo, chegando a cassar inclusive mandatos de tradicionais apoiadores do golpe. Udenistas representantes da fina flor do conservadorismo nacional como Carlos Lacerda e Seixas Dória foram vitimados pelo monstro que solenemente ajudaram a criar. Aliados diversos chegaram a fazer mea culpa pelos seus antigos posicionamentos. Dom Paulo Evaristo Arns, por exemplo, entusiasta da “revolução”, não demorou a perceber a magnitude das violações que o governo militar traria à sociedade. Semelhante coisa aconteceu com o General Golbery de Couto e Silva, criador do temido Serviço Nacional de Informações (SNI), que lamentou publicamente o recrudescimento das ações da sua cria.

Segundo, Aluízio não só deu suporte ao golpe de 1964, como, em uma emblemática atitude de vassalagem, publicou, na edição de 2 de abril do Diário de Natal, nota na qual afirmou o seguinte: “O governador do Rio Grande do Norte, agora informado das razões e objetivos do movimento ontem deflagrado sob a liderança do governador Magalhães Pinto, quer manifestar o seu apoio aos ideais dessa oposição que vista a autêntica legalidade democrática realmente ameaçada por atitudes fatos que não eram ainda de conhecimento público”.

A deliberada subserviência de Aluízio ao regime de não se resumiu a uma nota de jornal. Adotou o oligarca uma postura ativa no auxílio à paranoia verde-oliva de perseguição indiscriminada aos subversivos e potenciais adversários da ditadura, chegando a criar uma Comissão de Investigação paralela à dos militares. Tal caso é relatado com riqueza de detalhes por Mailde Pinto Galvão no ótimo “1964. Aconteceu em Abril”, obra na qual esmiúça com categoria os impactos locais do golpe: “O governador formou também sua Comissão de Investigações e contratou, no Estado de Pernambuco, dois policiais especializados, a quem concedeu poderes absolutos e excepcionais, com toda a mordomia oferecida aos hóspedes oficiais do governo do Estado. Não se tem notícia de outro governador que constituísse uma Comissão de Investigação paralela, com poderes especiais para processar, prender e encarcerar os supostos subversivos, como aconteceu no Rio Grande do Norte.” Mais à frente, conclui: “Com a Comissão Geral de Investigações instaladas pelos militares, mais duas comissões ditas de “alto nível” criadas pelo governador, e as outras implantadas em cada repartição pública estadual, municipal e federal, armou-se a maior rede de investigação policial militar de toda a história política do Rio Grande do Norte”.

Situações como esta evidenciam a importância da criação de comissões da verdade e memória que atuem nos âmbitos regional e local, pesquisando e reverberando acontecimentos históricos peculiares de cada localidade. Iniciativas assim são imprescindíveis para que sejam escancaradas as verdades sobre quem de fato foi perseguido e perseguidor, algoz e vítima, capacho e opositor do regime militar de 1964, impedindo que oportunistas se arvorem no esquecimento e no desconhecimento da população para se apresentarem como algo que definitivamente nunca foram. Henrique Alves, com sua vasta e abusiva influência política e econômica, pode ser capaz de muita coisa, mas não de apagar o passado.

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