Egípcios aprovaram Constituição na primeira etapa do referendo, indicam pesquisas

No Opera Mundi

A nova proposta constitucional egípcia foi aprovada pela maioria dos eleitores que compareceram nas urnas neste sábado (15/12), indicam pesquisas preliminares não oficiais. O resultado apenas será conhecido, no entanto, depois da segunda rodada do referendo no próximo sábado (22/12) quando a outra metade do eleitorado egípcio poderá votar.

"Não a Constituição", diz cartaz de manifestante que participa de protesto contra Mursi no Cairo
O polêmico texto recebe o apoio do presidente Mohamed Mursi e da Irmandade Muçulmana, mas foi muito criticado por um conjunto heterogêneo de organizações. Os oposicionistas querem mais salvaguardas para direitos das minorias, de liberdade de expressão e temem a imposição de preceitos muçulmanos.

A nova Carta Magna foi formulada e aprovada apenas pelos 234 membros islâmicos da Assembleia Constituinte durante uma sessão boicotada por representantes de outros setores.

O Partido “Liberdade e Justiça”, vinculado ao presidente e a organização muçulmana, divulgou pesquisa de boca de urna neste domingo (16/12) que mostram resultados favoráveis ao grupo. De acordo com as informações, publicadas em seu site oficial, 56,5% dos eleitores votaram pelo “sim” contra 43% que optaram pelo "não". No Cairo, palco dos protestos contra o presidente e o texto constitucional, a situação foi inversa: a maiora (56,9%) reprovou a proposta em pauta.

"O povo egípcio manifestou a sua vontade e opinião na primeira etapa do referendo constitucional e também provaram ser altamente conscientes, o que é um verdadeiro processo democrático", declarou o partido em nota.
A Frente de Salvação Nacional, uma coalizão de grupos que se opõem ao texto constitucional, anunciou que não reconhece resultados não oficiais e que vai esperar para o próximo turno do referendo. A organização decidiu nesta quarta-feira (12/12) fazer campanha pelo “não” no referendo ao invés de boicotar a votação, desde que haja salvaguardas para um processo justo.

Estima-se que apenas 33% dos eleitores, ou cerca de 8 milhões de cidadãos, compareceram na primeira etapa deste sábado (15/12). Mesmo assim, o dia foi marcado por extensas filas ao redor dos locais e a votação foi estendida por horas para todos os presentes poderem depositar sua escolha nas urnas.

As autoridades do país informaram que a votação discorreu sem problemas. Cerca de 120 mil oficiais militares se juntaram neste sábado (15/12) aos policiais nas proximidades dos centros de votação para conter possíveis protestos e confrontos entre manifestantes. Os soldados ganharam o poder temporário de prender ativistas e reprimir manifestações por conta de um decreto presidencial, que reavivou memórias do regime ditatorial de Mubarak.

Agência Efe (15/12)
Na primeira etapa do referendo, um cidadão egípcio vota a favor ou contra o novo texto constitucional que dividiu o país

Houve confronto apenas durante a noite, quando dezenas de apoiadores de Mursi atacaram a sede do partido opositor Wafd no bairro central do Cairo.

Irregularidades

Organizações de direitos humanos do país denunciaram neste domingo (16/12) que a consulta popular foi marcada por irregularidades, informou a Associated Press. Em coletiva de imprensa, representantes de sete grupos egípcios explicaram que o processo de votação não foi devidamente supervisionado e deve ser repetido.

A consulta popular está sendo realizada em duas etapas - a primeira neste sábado (15.12) e a segunda, no próximo (22.12) – para garantir a legalidade do processo. Os eleitores foram divididos entre estes dois dias pela falta de juízes disponíveis a supervisionar o pleito uma vez que muitos permanecem em greve pela discordância com a proposta, classificada pela principal associação da magistratura no Egito como um “ataque à Justiça”.

Uma nova ditadura?

O referendo deste sábado (15.12) deve determinar se o rascunho pode se tornar a nova Constituição e é considerado uma peça-chave para a consolidação da democracia do país, que passa por uma transição política desde a queda do regime ditatorial de Hosni Mubarak por protestos populares.

Caso os 51 milhões de eleitores escolherem pelo “não”, uma eleição será convocada para a formação de uma nova Assembleia Constituinte que deverá redigir outro texto que, novamente, deverá passar pelo crivo popular. Por outro lado, se a proposta for aceita pela maioria, a população deverá ir também às urnas para eleger o Parlamento.

A nova Carta Magna foi aprovada em um processo conturbado no país, marcado por intensos protestos que deixaram pelo menos 10 vítimas, e não contou com a participação de setores cristãos – muitos vinculados ao regime de Mubarak -, laicos nem de esquerda.

A crise política teve início no dia 22 de novembro, quando o presidente aprovou um decreto lhe garantindo poderes extraordinários, imunidade em relação ao Legislativo e Judiciário e a impossibilidade de dissolver a atual Assembleia Constituinte de maioria islâmica. A medida, entendida por muitos como a volta à era ditatorial, também impedia o cancelamento ou suspensão de decisões de Mursi, mas foi cancelada pelo próprio presidente por conta dos intensos protestos.

Desde então, milhares de egípcios tomaram as ruas do país em protestos contra ou a favor do texto constitucional e das medidas anunciadas por Mursi. Os muros próximos ao palácio presidencial estão repletos de grafites e frases que pedem pela democracia, liberdade do povo e ironizam o presidente, vinculado a Irmandade Muçulmana. Pelo menos 10 pessoas morreram e mais de mil ficaram feridas nas últimas três semanas.

A nova Carta Magna também foi criticada por organizações internacionais. A Comissão Internacional de Juristas concluiu nesta sexta (14.12) que a proposta constitucional não corresponde a padrões internacionais, como os de responsabilidade do Exército, independência do Judiciário e reconhecimento de direitos humanos. O Grupo de Trabalho da ONU sobre discriminação contra mulheres também pede, em comunicado nesta sexta-feira (14/12), uma revisão da minuta, para que o país respeite as obrigações das leis de organizações em favor do direito das mulheres das quais faz parte.

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