Será que o Sinal Fechado deságua numa Cachoeira?

Maurício Dias, da CartaCapital, em sua Rosa dos Ventos desta semana, traz uma nota sobre os negócios legais de Cachoeira.  Chamou minha atenção:
Lado A...
Carlinhos Cachoeira tem uma fachada de negócios legais.
Uma das empresas dele opera com inspeção veicular e, preferencialmente, com os governos estaduais tucanos: Marconi Perillo (Goiás), Siqueira Campos (Tocantins), Teotônio Vilela (Alagoas) e Anchieta Júnior (Roraima).
Ele tentou entrar em Minas Gerais, mas consta que a porta lhe foi fechada.
Quando foi deflagrada, a Operação Sinal Fechado prendeu, em 24 de novembro de 2011, o suplente de senador, ex-deputado e ex-braço direito de Aloysio Nunes Ferreira na casa civil de São Paulo, João Faustino.  A investigação diz respeito à organização criminosa, comandada pelo advogado George Olímpio, que tentava explorar a inspeção veicular no RN.
Desde o início, o negócio tinha traços de ser nacional.

Uma das visitas que João Faustino recebeu, preso, foi do senador Aloysio Nunes.  Era dois de dezembro, cerca de dez dias após a prisão de Faustino.  Publiquei a respeito aqui.

Depois de dizer a Leandro Fortes, da Carta Capital, que seu "grande amigo", João Faustino "é um homem corretíssimo, duvido que ele faça parte de um esquema criminoso", chega esta noite a Natal o senador tucano Aloysio Nunes Ferreira (SP). Aloysio foi motorista de Carlos Marighella. No governo Serra, chefiou a Casa Civil. João foi seu segundo.
Uma visita de solidariedade de peso. Será?
Somente aí já são dois vínculos fortes entre os envolvidos e o PSDB.  Outro se dá na situação sobre a qual tenho falado sempre: em 01 de outubro de 2010, depois de receber o depósito de R$100 mil em sua conta de uma das empresas do Consórcio Ecovias - que administra as estradas concedidas em São Paulo -, o PSDB potiguar pagou R$ 100 mil ao advogado George Olímpio, líder da organização criminosa reunida no Consórcio Inspar.  Esse é o terceiro vínculo.
Abordei aqui, neste blog, em outros momentos, os sinais de que a organização tinha desdobramentos em outros estados.
A organização tinha um braço cearense, onde se destacava a relação com o ex-senador tucano, Tasso Jereissati.  Falei sobre isso aqui, num contexto em que explicava que a investigação do grupo criminoso, feita pelo Ministério Público estadual, recuou alguns anos e descobriu que as ações criminosas começaram a respeito do registro obrigatório em cartório de veículos financiados.  Para isso, o grupo fez lobby em Brasília, no senado, em 2008, quando o presidente era o senador Garibaldi Filho (PMDB/RN), de quem João Faustino (PSDB) foi suplente na legislatura anterior - tendo exercido a efetividade do mandado durante alguns meses de 2010.


No post anterior (nota: republicarei esse post a seguir), em que falamos sobre algumas implicações da Operação Sinal Fechado em Minas Gerais, apareceu o nome de Cláudio Pinho, presidente do Instituto de Registro de Títulos e Documentos e de Pessoas Jurídicas do Ceará (CECAF). Sua intenção era entrar no negócio de registro de veículos em Minas Gerais mas foi aparentemente preterido em favor de George Olímpio. Vanuza Arruda promete-lhe uma saída alternativa, mas ele não fica muito feliz.

Mas para além dessa relação, há outras implicações cearenses no esquema fraudulento. O vice-presidente do CECAF, Luís Cláudio Morais Correia, é sócio de George Olímpio em duas de suas empresas que participaram das fraudes descortinadas pelo Ministério Público: MBMO e DJLG. Além disso, Daniel Maia, participante falecido do esquema, era o vice-presidente do CECAF. Atualmente, a viúva de Daniel é a companheira de George Olímpio. Daniel morreu em um acidente durante uma prova de automobilismo em 28 de novembro do ano passado.

Na foto, Daniel e sua esposa Juliana. Note que faziam campanha para o governador Cid Gomes

Talvez isso explique o interesse que o grupo tinha, ainda em 2008, em que o senador cearense Tasso Jereissati (PSDB) fosse o relator da Medida Provisória que, por fim, acabava com o registro de veículos em cartórios. Em novembro de 2008, quando o grupo ligado aos cartórios foi fazer lobby com relação ao encaminhamento da MP 422, o genro de João Faustino, Marcus Procópio escreveu e-mail ao sogro para preparar a reunião com o presidente do Senado, Garibaldi Filho (PMDB). Em determinado momento do e-mail, diz Marcus:
Aliás, caso não tenha sido designado relator para a matéria o ideal era que, num trabalho posterior conseguíssemos que o Presidente do Senado designasse o Senador Tasso para relatá-la, mas sobre isso falamos depois. 
Não é por acaso, evidentemente, que o grupo deseja a relatoria de Tasso Jereissati, embora ainda não tenha se estabelecido, ao menos nos documentos públicos da investigação, que relação pudesse ter o ex-senador com o grupo dos cartórios. Não dá nem para saber se em sua campanha de 2002 Tasso recebeu doação já que sua prestação de contas atribuía todas as receitas ao Comitê Financeiro.
O concreto é que há o estabelecimento do registro veicular também no Ceará. Tal informação aparece, por exemplo, na transcrição de um e-mail de Marcus Procópio a George Olímpio, em 18 de julho do ano passado. No e-mail está anexada uma reportagem da Tribuna do Norte sobre a recomendação do Ministério Público para a suspensão da taxa para financiamentos que cita o Ceará como um dos estados que cobra a taxa.
No entanto, assim como no RN, a organização planejava ampliar a ação fraudulenta no Ceará, operando a inspeção veicular. Em 26 de setembro, em um telefonema capturado, George informa a João Faustino que estava em Fortaleza. O Ministério Público descobriu que pelo menos desde maio a organização negociava com o governo do Ceará, "devendo", diz a denúncia, "o 'negócio' [da inspeção veicular] estar em vias de concretização ou já aperfeiçoado".

Marco, com endereço em Aracaju, também tem relações e negócios no Ceará.  Ao retornar de viagem no dia 17 de outubro, George fala com Juliana Falcão para pegar um telefone de Marco no Ceará.  Além disso, Marco, lobista, foi preso no RS. Aí a gente volta à foto da denunciada Juliana Falcão ao lado de seu marido morto, Daniel.  Estavam em plena campanha por Cid Gomes.  Juliana é, atualmente, a namorada de George Olímpio.  A foto, em um comitê de campanha, demonstra, no mínimo, "afinidade"ideológica entre o governador Cid Gomes (PSB).  Será que é somente isso?  As perguntas sobre os braços cearenses da organização desbaratada pela Operação Sinal Fechado ainda estão por serem feitas.

Quando olhamos os laços da organização no Ceará, mais um tucano de alta plumagem emerge sob suspeita.  Por que eles queriam Tasso como relator?
Aí eu começo a olhar com outros olhos para a nota de Maurício.  Ele diz que Cachoeira tem negócios com inspeção veicular em vários estados, especialmente com tucanos no governo - citando entre outros o caso de Alagoas.
A investigação do Ministério Público estadual do RN cita, diretamente, o estado de Alagoas.  Falei sobre isso neste post:


Em conversa telefônica captada em 11 de maio de 2011, Alcides Barbosa diz a Marco Aurélio que Alagoas está acertada com respeito à inspeção veicular:


Em outubro, uma nova conversa entre os dois mostra que a negociação com Alagoas avançou. Através de um intermediário de Renan Calheiros, senador pelo PMDB.

Em Alagoas, a fraude estava bem próxima de uma nova operação semelhante à Natal. Afinal, além de abrir o estado inteiro, o enviado de Renan garantiu que até a elaboração da lei estaria a cargo da organização criminosa. Marco perguntou a Alcides se ele colocará George ou fará a ação em Alagoas sozinho. Alcides diz que conversará com George questionando se ele quer ir fazer o negócio em Alagoas.
Mais um estado governado pelo PSDB e com um esquema de fraude semelhante aos outros estados.

Veja que eu fiz uma relação semelhante à de Maurício com Cachoeira a respeito dos réus da Operação Sinal Fechado. O post trata também da situação em São Paulo, focada na prefeitura de Kassab - enrolada até a tampa com os esquemas fraudulentos com respeito à inspeção veicular com a Controlar, que participou da fraude no RN, mas cujos indícios não convenceram a juíza do caso a aceitar a denúncia contra Harald Peter Zwetkoof, dono da empresa.
Porém, o vínculo mais forte que se estabelece entre o que diz Maurício Dias e a Operação Sinal Fechado é a relação com o estado de Minas Gerais.  Diz Maurício que Carlinhos Cachoeira "tentou entrar em Minas Gerais, mas consta que a porta lhe foi fechada".  O MPE do RN descobriu como a organização do RN entrou em Minas no serviço de registro de automóveis.  Diz a denúncia do MP do RN:

(...) fortes evidências demonstram que a organização também está se instalando, ou já se instalou, em Minas Gerais, para implantar o registro dos contratos através da PLANET BUSINESS LTDA.
 E o meu post de 10 de dezembro, escrito no dia em que Aécio Neves esteve em Natal:


Com base em que se pode afirmar isso (ou seja, a instalação da organização em Minas)? Em 23 de agosto uma conversa entre George Olímpio e seu sócio da Planet Business, Nilton Meira. Nela, conversam sobre as articulações do negócio de registro de veículos. O papo gira em torno de parceiros de negócio em Minas e no Ceará, sobre quem falaremos mais adiante.

Vanuza de Cássia Arruda é presidente do Instituto de Registro de Títulos e Documentos e de Pessoas Jurídicas de Minas Gerais (IRTDPJMinas). A partir da busca e apreensão de documentos realizada pela Operação Sinal Fechado, o MP encontrou um contrato de honorário advocatícios entre George Olímpio e o Instituto de Minas Gerais. Por cada carro registrado em MG, George receberia R$ 4,50. É muito provável que tenha sido essa a estratégia utilizada para que George pudesse ser sócio da organização que realiza o registro de veículos em Minas.
Na conversa transcrita acima, aparentemente, Nilton e George conversam sobre uma entrada futura no negócio de registro de veículos em Minas Gerais. Segundo a conversa acima, Claúdio Pinho, presidente de entidade cearense semelhante a que era dirigida de fato por George Olímpio no RN e por Vanuza Arruda em MG, foi preterido em favor de George na obtenção do contrato de registro com o Detran mineiro.
O Ministério Público descobriu também que não era a primeira vez que George participava do negócio de registro de veículos em Minas. Segundo disse o advogado apontado como líder da organização criminosa, “não pode aparecer [em Minas], mas se tiver uma interlocução, é uma forma de entrar lá e lá é bom, né?”.
Isto se dá porque GEORGE OLÍMPIO já obteve o registro dos contratos em Minas Gerais anteriormente, muito provavelmente através do próprio IRTDPJMinas.
Ainda na petição inicial do Ministério Público há o destaque para uma conversa entre outros dois denunciados: o lobista Alcides Barbosa e Marco Aurélio Doninelli. A conversa foi gravada em 13 de maio. Nela, os dois conversam sobre George e situam a primeira inserção do advogado em Minas Gerais há três anos, antes mesmo do negócio ser implantado em Natal. Em março de 2009, o Detran/MG cancelou o contrato.
No dia anterior ao diálogo abaixo, o IRTDPJMinas havia entrado com mais uma ação na justiça tentando reverter a decisão de cancelamento do contrato. É essa esperança que George tem do retorno ao negócio mineiro.


Mas esse diálogo revela ainda uma coisa mais séria. Segundo o relato, o negócio em Minas estava difícil "porque o Vice-Governador de lá, o José Alencar, não saber disso, ele é contra isso...". Evidentemente há um equívoco aqui com relação aos nomes. José Alencar era o vice-presidente da República, mineiro, mas não o vice-governador. Em 2009, o vice-governador mineiro era o atual governador, Antônio Anastasia. Aparentemente Anastasia era a resistência para que o negócio prosperasse no Detran mineiro, mesmo que George estivesse voltando ao negócio mineiro este ano, através do IRTDPJMinas, quando Anastasia é o governador. O contrato de honorários do Instituto com George comprova isso, ainda mais vinculando o pagamento ao registro de veículos.Quem falta nessa história? Se a resistência ao negócio vinha do então vice-governador e atual governador Antônio Anastasia, não vinha do então governador e atual senador Aécio Neves. A conjectura não é despropositada, ainda mais se lembrarmos que um dos principais articuladores da quadrilha potiguar é o membro da executiva nacional do PSDB, João Faustino.É preciso lembrar, também, que uma das principais implicações da ex-governadora Wilma de Faria (PSB) com a Operação Sinal Fechado diz respeito ao fato de que ela permitiu a instrumentalização da organização em seu governo. Se foi assim com Wilma, não pode ter sido assim com Aécio?Aparentemente há uma relação da operação da organização criminosa que começou a ser desbaratada em Natal com os governos tucanos.

Será que o Sinal Fechado deságua numa Cachoeira?

Comentários