#HomofobiaNao: @jeanwyllys_real: Direito à cidadania por inteiro

Por Rafael Duarte, do Novo Jornal

O baiano Jean Wyllys ouviu a palavra ‘viado’ pela primeira vez aos seis anos de idade. Foi um baque. Naquele dia, saiu de casa para comprar pão na vendinha do bairro a pedido da mãe. Entrou na bodega, olhou o padeiro de baixo para cima, pediu seis pães e tomou um susto quando, em vez do produto, recebeu de volta uma pergunta do sujeito que nunca mais esqueceu:
- Você é viado ou estudado?
Na época, Jean morava em Alagoinhas, no interior da Bahia e, quando fez o pedido, lembra que o que espantou o sujeito foi a pronúncia correta, no plural, da palavra ‘pães’. Para um garoto de seis anos, a reação do padeiro e das pessoas que estavam no local foi marcante. “Pela forma como ele falou e a reação das pessoas em volta, vi que eu não deveria ser viado”, disse.
A história foi narrada pelo deputado federal Jean Wyllys ontem, no auditório da reitoria da UFRN, durante a aula magna promovida pelo Centro Acadêmico do curso de Direito. Ao lado dele, o doutorando em Direito José Humberto Góes, na palestra ‘Os direitos da Comunidade LGBT e os avanços nos tribunais brasileiros’.
Na plateia, estudantes universitários, professores, convidados e jornalistas. Sim, aquele menino de seis anos do interior da Bahia hoje é parlamentar no Congresso Nacional. Pelo PSOL, partido que nasceu da militância expulsa e insatisfeita com o PT, Jean obteve 13 mil votos e conseguiu a vaga na Câmara dos Deputados graças aos 240 mil votos que seu companheiro de partido, o deputado Chico Alencar, obteve no mesmo pleito. Wyllys entrou na Casa pelo coeficiente eleitoral e vem fazendo jus à vaga que conquistou. Hoje, é um dos deputados mais atuantes, sobretudo em defesa dos direitos da comunidade LGBT, representada por Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transsexuais.
O baiano de Alagoinhas ficou nacionalmente conhecido quando venceu em 2005 o reallity show da Rede Globo, Big Brother Brasil. Foi o primeiro a ganhar R$ 1 milhão no programa, que até então só pagava a metade desse valor ao vencedor.
A luta dele em defesa do direito dos homossexuais, no entanto, é anterior. Wyllys rompe ainda na adolescência com a pastoral da Igreja Católica por incompatibilidade entre o que a igreja prega sobre a homossexualidade e a vida que escolheu para si. Quando muda para Salvador com a família, aos 16 anos, passa a conhecer o circuito gay da capital baiana e entra, definitivamente, para o movimento que, na época, ainda era denominado apenas ‘gay’, sem a absorção dos outros segmentos que criaram a sigla hoje difundida LGBT.
“Encontrei no movimento um lugar onde eu poderia me juntar aos meus iguais para defender meus direitos. Mas a inserção no movimento é antecedida pela entrada na comunidade, que é quando você passa a circular pela cultura gay e conhece um circuito de boates, bares e então você conhece os seus iguais, identifica seus pares. Só então você entra no movimento”, conta.
Antes de iniciar a carreira como deputado, o garoto que impressionou o padeiro da bodega pelo português dito de forma correta aos seis anos de idade também virou jornalista e escritor. Com três livros escritos e vários prêmios de jornalismo conquistados, sempre na área de direitos humanos, Jean também é professor universitário no Rio de Janeiro, estado pelo qual se elegeu depois que a então senadora Heloisa Helena, em 2006, o convenceu a entrar para as fileiras do partido e a se candidatar.
“Ela me convenceu com o argumento de que a política precisa de renovação e de gente com coragem para assumir certas bandeiras. Pensando não nas próximas eleições, mas nas próximas gerações”, diz.
Com a língua afiada, não deixa pergunta sem resposta. Durante a aula magna, lançou frases que merecem da sociedade, ao menos, uma reflexão. Em constante embate com a bancada evangélica da Câmara dos Deputados por conta da bandeira que defende e desafeto declarado do também deputado Jair Bolsonaro, a quem chegou a discutir publicamente numa reunião da comissão de Direitos Humanos da Casa durante a polêmica criada em torno dos kits escolares que o Ministério da Educação iria distribuir nas escolas como meio de combate ao preconceito, Jean Wyllys trabalha em duas frentes no Congresso: aprovar as propostas de emendas à Constituição (PEC) para assegurar que a união civil entre homossexuais vire lei assim como a violência contra homossexuais seja tratada como crime.
Para ele, sem direito ao casamento, os homossexuais são cidadãos pela metade. “Assim como o 13° salário e as férias, o casamento também é um direito, é você ter liberdade de escolher alguém para ter uma vida comum. E esse direito, no momento, é só dos heterossexuais. Então quando você é alijado do direito de amar, de um projeto de vida, você é um cidadão pela metade. E é injusto que você seja um cidadão pela metade porque você paga impostos e está submetido às mesmas leis como estão os heterossexuais”, afirmou.


JEAN
FRASE A FRASE


Política
“O Aloísio Mercadante me disse que só a política institucional é transformadora e fui para casa com aquilo na cabeça. Mas quem me convenceu a ser candidato foi a Heloísa Helena, em 2006, com o argumento de que a política precisa de renovação e de gente com coragem para assumir certas bandeiras. Pensando não nas próximas eleições, mas nas próximas gerações”.


“A política institucional não me traz nenhum benefício. Pelo contrário: me botou em rota de colisão com as forças mais conservadoras que não só empreendem uma campanha difamatória contra mim, como me ameaçam de morte. Sou deputado não por uma questão pessoal, mas por uma questão coletiva”.



Orgulho gay
“Meu sexo biológico é masculino porque nasci homem, minha identidade de gênero é masculina porque me vejo como homem, mas minha orientação sexual é homossexual. Tenho orgulho de ser gay”.

“Se a natureza dá dentes tortos e as pessoas recorrem a aparelhos para se adaptarem, se as mulheres recorrem a cremes e produtos para alisar os cabelos, porque os travestis e transexuais não podem querer mudar o sexo biológico já que não se sentem bem?”


Preconceito
“A universidade não é lugar para a reprodução de dogmas religiosos, mas para a produção e reprodução do saber científico”.

“Os homossexuais são preconceituosos com eles mesmos sim. Qual é o livro de história que traz um homossexual como protagonista? Os homossexuais introjetam e reproduzem a homofobia”.

Direitos
“Ninguém é obrigado a amar homossexuais. Ela pode continuar dizendo que não gosta, que não quer aquilo para ela. Mas não pode impedir os homossexuais de acessarem direitos”.
Casamento
“O STF concedeu a união estável, mas ainda não é casamento civil ainda. É preciso alterar a Constituição”.

“Quando o casamento é negado aos homossexuais, há uma discrepância jurídica. E isso é inadmissível”.

“Os heterossexuais não saem perdendo com a união civil entre homossexuais. Só quem ganha são os homossexuais, o estado democrático de direito e o senso comum”.


Congresso
“Disse outro dia para um deputado na Câmara: “Deputado, o senhor gostaria de ser chamado de ladrão?” Mas a injúria contra homossexuais é permanente”.

“Eles não conseguem me confinar nesse lugar subalterno porque eu me reafirmo gay com muito orgulho e tenho assento na mesma Câmara dos Deputados que eles”.

“O deputado Garotinho, da bancada evangélica, disse que tinha um diamante de 20 milhões de reais na mão para usar contra o governo na época das denúncias contra o Palocci. Esse é o tipo de moral mais torpe que eu já vi na minha vida”.

“Não dá para ser condescendente com quem é cruel por diletantismo. O meu amor tem limite. Como diz o Caetano, eu também tenho fígado”.

“O projeto do Popó, assinado por mais dois deputados, proíbe o Estado de criar qualquer política pública em favor das minorias, leia-se homossexuais. Esse projeto caiu na minha mão, sou o relator dele. E, claro, meu parecer é pela total rejeição”.

Orgulho Hétero
“Mandei uma carta para o Kassab (prefeito de São Paulo) falando sobre o Dia do Orgulho Hétero. Há três opções: ou é deboche ou é fruto da má fé ou é absoluta ignorância. Para mim é má fé”.

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