Polícia que mata: Polícia identifica PMs envolvidos em gravação de vídeo

Da Folha de São Paulo


O comando da PM disse ontem já ter identificado dez policiais presentes no episódio em que dois suspeitos são filmados após serem baleados.
Nas gravações, reveladas anteontem pela Folha.com, os dois homens cobertos de sangue são xingados e ameaçados. Um deles agoniza.
Pela versão da corporação divulgada ontem, o fato ocorreu em 9 de maio de 2008, na zona leste de São Paulo.
Os dois homens que aparecem feridos são Tiago Silva de Oliveira e um adolescente que à época tinha 16 anos.
A PM diz que eles eram suspeitos de roubar talões de cheques, celulares e R$ 525.
"Estrebucha, filho da puta" é uma das frases ditas por policiais enquanto Oliveira permanece caído no chão, com a boca cheia de espuma.
Ainda de acordo com o comando da PM, ele foi levado para o hospital Sapopemba, também na zona leste, mas morreu três dias depois.
O adolescente está vivo. Seu nome não foi divulgado. Ele foi ouvido ontem de manhã pelo grupo da PM que investiga a gravação do vídeo e disse não ter condições de reconhecer os PMs envolvidos.
A PM diz ter sido pega de surpresa pela divulgação do material, motivo pelo qual não havia investigado antes.
Após a Folha.com revelar o caso anteontem, o secretário de Estado da Segurança Pública, Antonio Ferreira Pinto, pediu "investigação imediata" tanto da Polícia Militar como da Polícia Civil.
A Folha apurou, no entanto, que as autoridades paulistas tinham conhecimento do vídeo havia duas semanas.

Abordagem
Segundo a versão da PM, o guarda-civil André Pereira Alves atirou na dupla em uma perseguição. Alves não foi localizado ontem pela Folha.
Após a abordagem, o reforço foi chamado. Quatro carros que levavam dez policiais militares -um deles oficial- chegaram logo em seguida.
À época, todos os PMs trabalhavam no 38º Batalhão.
As cenas, então, começaram a ser gravadas, provavelmente pelo celular de um PM.
"Está vendo o inferno? Esse não morreu ainda? Deu sorte, hein, meu!", afirma o homem que grava as cenas ao adolescente, que está consciente e aparentemente apenas levemente ferido.
A Oliveira, o policial diz: "Filho da puta, você não morreu ainda? Olha pra cá!".
A Corregedoria da PM começou a ouvir os dez policiais ontem. Os interrogatórios devem continuar hoje.
O comando da corporação não divulgou ontem o nome dos policiais militares envolvidos no episódio.


Coronel pede desculpas públicas à família de baleado agonizante

O comandante-geral da Polícia Militar, coronel Álvaro Batista Camilo, pediu ontem desculpas públicas à família de Tiago Silva Oliveira, que aparece agonizando nas imagens gravadas por um homem da corporação.
"O pedido de desculpas sempre acontecerá quando algum PM fizer algo de errado", afirmou o coronel. Esse foi um fato grave com o qual não compactuamos", disse.

Comportamento
O delegado-geral da Polícia Civil paulista, Marcos Carneiro Lima, também comentou ontem o episódio e a repercussão que as cenas vêm tendo na opinião pública.
Para ele, a sociedade não pode apoiar ações violentas contra criminosos, por pior que possam ser, porque isso estimula o surgimento de assassinos sem "parâmetros".
Para o delegado, quem defende a tese de que "bandido bom é bandido morto" poderá vir a ser vítima de maus policiais. Ele ressaltou se referir à toda instituição, incluindo policiais civis e militares.
"A sociedade tem que entender que policial nenhum deve ter esse poder [de matar um suspeito]. Porque, amanhã, numa discussão de trânsito, ele mata quem discutir com ele, pois perde os parâmetros de comportamento."
Ele citou o caso dos policiais que mataram, em 2008, o coronel José Hermínio Rodrigues, que tentava punir crimes de PMs. "Não se pode estimular que o policial tenha o direito de exterminar. Polícia forte é dentro da lei. Saiu da baliza legal, perde força."
O delegado-geral comentou ainda o recente episódio em que a Rota matou seis ladrões durante uma tentativa de assalto a caixas eletrônicos de um supermercado da zona norte de São Paulo.
Há suspeita de que a tropa de elite da PM paulista tenha armado uma emboscada.
Ele disse que o caso é "complexo e com vários atores". Por isso, não se pode fazer um "prejulgamento" dos policiais, que ocupam uma "profissão de alto risco" em que há "muita adrenalina".
"Se houver indícios de simulação, cabe à polícia apresentá-los à Justiça e será ela quem vai julgar. É preciso ser feito de uma forma tranquila. De forma nenhuma pode haver prejulgamento", disse.
Lima afirmou ainda que as resistências seguida de morte -quando um policial mata alguém durante um confronto- caíram 12% em relação ao ano passado.

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