Agosto de quem?

Da Revista Catorze





Pode-se dizer que a agonia começou no Cultura em Debate, no dia 8 de setembro de 2010. No evento produzido por essa revista e pelo Núcleo de Jovens Artistas a então candidata Rosalba Ciarlini falou em transformar Natal na capital do folclore. Na terra onde os alicerces de uma tão almejada identidade cultural sequer foram erguidos, uma afirmação como essa tem um gosto amargo de “política de eventos” no lugar da doce “política cultural”.

Mas tem que ver pra crer ou criticar. Com o fim do Agosto da Alegria promovido pela rebenta Secretaria Extraordinária de Cultura, procuramos a opinião de artistas e produtores culturais da cidade. Isso mesmo, aquelas pessoas que vivem de produzir, buscam fundos e promovem a arte e a cultura.

Eles não estão muito felizes.


Anderson Foca – Produtor do Espaço Cultural Dosol

Falta Diálogo

Como show, entretenimento e afins a programação foi positiva. O problema é a falta de diálogo entre os produtores, artistas e fundação. Só como exemplo, quase todos os projetos culturais da cidade fizeram ou vão fazer alguma interação com o Circuito Cultural Ribeira e nem se quer fomos procurados pela programação do Agosto da Alegria para promover algo dentro do circuito, um show, um artista maior e afins. Isso é só um exemplo da falta de conectividade do projeto com parte significativa dos atores culturais da cidade. Estamos muito bem de eventos, temos dezenas deles, o governo não precisaria inventar mais um. Falta mesmo é um política de continuidade, baseada em leis específicas para área que garantam investimentos contínuos as ações culturais. De resto, todo mundo gosta de ver Paulinho da Viola e Siba, mas quando os shows terminam o que sobra para a classe além das boas lembranças?

Respondo deixando essa pergunta. 


Buca Dantas – Cineasta
Governo não tem que fazer cultura

Na minha opinião governo não tem que fazer cultura. Quem faz cultura é trabalhador de cultura. Governo tem que fazer é política de cultura. Tem que se reunir com os artistas e organizar políticas cultuais. Mas antes de tudo, antes de realizar qualquer coisa tem que pagar o que deve. Fiz questão de não comparecer a nenhum evento do Agosto da Alegria para não fazer quórum porque eu sei do meu peso na cena cultural local.


Renata Marques – Produtora da Tropa Trupe
Eventos de Tenda

A programação foi legal. Acho que diferente da prefeitura que procurou promover eventos religiosos, esse evento procurou por outra linha. Mas continuamos em políticas de eventos. Pior, eventos de tenda. O dinheiro que se gasta para montar um estrutura como os palcos e tenda não poderia servir para incentivar os grupos que já tem espaços ou os lugares que já existem. Esse Festival gastronômico, por exemplo, vários bares e restaurantes foram levados até as tendas, por que não levar a visitação aos locais de origem? Assim também é com a cultura popular. É mais interessante levar o público ao habitat natural da apresentação do que montar um palco mixuruca para essa exposição. O primeiro evento desse novo governo não mudou nada. Não tem nada de novo. Faltou uma convocatória pública, para estimular o diálogo com os artistas. Existe um descrédito muito grande na imagem da fundação. Nós da Tropa-trupe não temos mais vontade de fazer nada para fundação.


Gutenberg Costa – Folclorista
O perigo está em ser apenas mais um evento


O perigo está em ser apenas mais um evento. No Rio Grande do Norte contamos nos dedos de uma mão eventos que existem a mais de cinco anos na área cultural. O mais antigo é a festa do boi, que já está com seu lado cultural distorcido. Os outros mudam a cada governo, muda o nome e sentido. A política é passageira, rápida e de interesses. Para se fazer um evento sério precisa ter um debate com a classe. Houve acertos e falhas. O acerto foi iniciativa. Mas a falha foi à falta de diálogo com todas as áreas. Não adianta chamar um grande nome nacional e fazer uma palestra se temos tanta coisa local para falar que ficou a margem, se os cachês são baixos e atrasados, tanto nível de governo quanto de município. Eu já cheguei em casa de pessoas com muito reconhecimento, muito “papel na parede” mas sem a panela no forno, sem o essencial, passando fome mesmo.

Comentários