Balanço do encontro de blogueiros

Abertura do Encontro de Blogueiros Progressistas da Grande Natal

Fotos de Lenilton Lima

Tácito Costa

Cheio de coisas pra fazer nesse início de semana não comentei o Encontro de Blogueiros Progressistas da Grande Natal que ocorreu sexta à noite e sábado o dia todo no IFRN da Cidade Alta. Gostei demais do evento, aprendi um pouco mais sobre algumas coisas e me atualizei sobre outras, enfim, um saldo bem positivo.

Não me acho suspeito pra elogiar só porque participei de uma das mesas, por sinal a única que não gostei, achei que destoou das demais (assisti todas). Poderia ter rendido mais. Penso que a gama de temas propostos, cultura, políticas públicas, propriedade intelectual e web travou um pouco as explanações.

Pensando em minimizar essa dificuldade, preferi ler um texto que preparei durante a semana. Quando me debrucei sobre o tema preparando-me para o debate temi me perder e ser pouco objetivo, então achei melhor preparar um texto, embora não goste, enquanto espectador, de palestrante que opte pela leitura. Tive o bom senso de escrever um texto curto.

Mesa da qual participei junto com Fábio Lima, Esso Alencar, Sérgio Vilar e Marcelo Othon (em pé, Daniel Dantas faz um comunicado)

De qualquer maneira acho que fiz uma crítica fundamentada ao Ministério da Cultura, que foi defendido pelo chefe da Representação Regional Nordeste do MinC e blogueiro Fábio Lima, que estava na mesa. Resumindo: para ele, o problema atual do MinC e da ministra Ana de Hollanda é de comunicação. Para mim, é de competência.

Cláudia Santa Rosa, Rui Rocha, Marcos Silva e Arnon de Andrade debateram sobre educação

Pela importância e qualidade do encontro juntou pouca gente (exceto na abertura, que lotou o auditório). No sábado, as palestras tiveram média de 25, 30 pessoas.

O primeiro encontro, do qual participei, também não atraiu um número grande de pessoas, acho que o próximo deve ser repensado, talvez fazer tudo um dia, com menos palestras, enfim, deve se buscar uma alternativa para essa situação.

Reproduzo a seguir, com leves adaptações, o texto que li no evento.

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PALESTRA

Cultura, Política Públicas, Propriedade Intelectual e Web.

O Substantivo Plural posta com regularidade textos do antropólogo Hermano Vianna, autor dos livros "O Mistério do Samba" e "O Mundo Funk Carioca" e co-criador da ONG Instituto Overmundo – website colaborativo voltado para a divulgação da cultura brasileira.

É um dos caras mais antenados com a contemporaneidade cultural no Brasil atualmente.

Em um texto publicado no ano passado ele diz o seguinte:

"Não há respostas prontas ou fáceis para os desafios que a digitalização impôs, de forma avassaladora, para a relação criadores/público/mercado/ mídia. Nenhuma das experimentações em andamento parece indicar solução duradoura. Ainda vamos ter que conversar muito para chegar a novos arcabouços jurídicos ou modelos de negócio que aproveitem o melhor da situação atual. Já repeti várias vezes: deixamos a economia da escassez, o que é ótimo. Mas não descobrimos como viver com tanta abundância criativa."

Esse novo mundo de abundância criativa citado por Hermano dividiu o meio cultural globalizado em duas forças em confronto: de um lado as corporações que produzem filmes, CDS, DVS, games, etc.

Liderando essas corporações está a poderosa International Intellectual Property Alliance – IIPA (Aliança Internacional de Propriedade Intelectual).

Criada em 1984, a IIPA é uma coalizão privada de associações comerciais que representam as indústrias dos EUA interessadas na expansão do copyright.

A IIPA conta com apoio explícito do Governo americano. E uma prova recente disso foi o pedido do Secretário de Comércio dos EUA, Gary Locke, no ano passado, durante a visita de Obama ao Brasil, para se reunir com a ministra da Cultura, Ana de Hollanda. O pedido, em forma de "visita de cortesia", partiu do governo americano e tinha como pauta um tema quente para o Ministério: propriedade intelectual.

Essa visita foi uma reação à discussão fomentada nas gestões de Gil e Juca sobre a revisão na lei brasileira de direitos autorais que, se aprovada, criaria exceções para o uso educacional e legalizaria o remix e cópias privadas e não-comerciais de obras protegidas.

É preciso lembrar, também, que os esforços em controlar a internet partem de países sob regimes políticos tão diferentes como EUA, França, Espanha, China, Irã e Cuba. Uns miram na questão comercial, outros na liberdade de expressão.

Nesse contexto cabe citar leis como:

SOPA – Stop Online Piracy Act (Lei de Combate à Pirataria Online);

PIPA – Protect Intellectual Property Act (Lei para Proteger a Propriedade Intelectual);

ACTA – Anti-Counterfeit Trade Agreemen (Acordo Comercial Anticontrafacção);

e a Lei Azeredo, no Brasil.

Essas leis, a pretexto de combater a pirataria, visam mesmo é controlar a internet.

Já foi com base na SOPA, por exemplo, que ocorreu a prisão do fundador do site Megaupload Kim Dotcom na Nova Zelândia. Preste atenção: o cara foi acusado nos EUA e detido na Zona Zelândia. Esse é um precedente que deixa todo mundo de cabelo em pé. Poderia ter sido preso no Brasil.

O outro lado nessa questão são os que entendem que a cultura deve ser um bem comum, ferramenta de inclusão social, os que defendem a democratização e a liberdade de expressão e que entendem que por trás do trabalho de um autor está o acúmulo de conhecimento, saber e inteligência de toda a humanidade. Nesse contexto é absurdo se falar em autor. Mais sensato seria se referir a autores.

Temos hoje legislação e práticas interpretativas de uma cultura jurídica defasada, inspirada numa realidade social, econômica e tecnológica que não mais existe. Ou que começa a deixar de existir, baseada em um mundo de imprensas mecânicas e papel, de suporte físico material.

O fato é que as mudanças são inexoráveis. E a história mostra quem vence. Me ocorrem dois exemplos disso, a invenção da imprensa por Gutemberg, e as mudanças no cinema, que foi do mudo ao digital. Quem não se adaptou pagou um preço (assistindo a O Artista, em cartaz, não pude deixar de pensar nisso).

A CULTURA SOB ANA DE HOLLANDA

Não poderia encerrar sem fazer menção ao desmonte promovido no Ministério da Cultura.

Fiz uma pesquisa no Substantivo Plural e descobri que publicamos 102 textos sobre o Minc desde que ministra assumiu. Mais de 90% das notícias são negativas.

CONFIRAM AS MANCHETES DOS ÚLTIMOS DEZ POSTS:

1 – O Ministério da Cultura e a caricatura do Brasil

2 – CULTURA, 2011: O ano que não existiu no MinC

3- Ana de Hollanda segue Juca Ferreira nos direitos autorais

4 – Ana de Hollanda entra na lista dos 'cotados para cair'

5 – A primavera neoliberal do MinC

6 – Ana de Hollanda diz que sua saída da Cultura não passa de especulação

7 – "MinC está cada vez mais unido", garante Sérgio Mamberti

8 – Na Câmara, Ana de Hollanda pede mais dinheiro para a Cultura

9 – Marta Porto, ex-secretária do MinC, faz críticas à atual gestão

10 – Entrevista com a ministra Ana de Holanda

Temos aí 8 manchetes negativas; levando-se em conta as 2 entrevistas de Ana, com foco na crise e a de Mamberti, também sobre a crise no MinC. Apenas duas, digamos, positivas, sobre direitos autorais e o pedido de mais dinheiro na Câmara.

Esse é apenas um dos parâmetros que podem ser usados para se medir o que ocorreu no Minc desde a posse da ministra Ana de Holanda.

Um desmonte que deixou a todos desnorteados e que começou logo no início da gestão, com:

• Retirada do selo do Creative Commons do site do MinC;

• Pedido de vistas do Projeto de Reforma da Lei de Direitos Autorais;

• Entrevistas da ministra, sempre alinhada com os setores mais atrasados.

Em um ano deixaram o MINC:

Marcos Souza, da Diretoria de Direitos Intelectuais (em seu lugar entrou a adv. Márcia Regina Barbosa, ligada ao Adv. do ECAD Hildebrando Pontes);

José Castilho Marques, Secretário Executivo do Plano Nacional do Livro e da Leitura;

Marta Porto, Secretária de Cidadania e Diversidade Cultural.

Tudo isso é muito grave e desalentador. Fraturou o diálogo, acabou a confiança e o entusiasmo que a gestão anterior construiu ao longo de oito anos do governo Lula. Por isso, não adianta buscar gerar mídia positiva divulgando-se que o orçamento para o Ministério passou de 1 bi e 700 em 2011 para 2 bi e 300 este ano. Não se trata de dinheiro, mas de filosofia de trabalho, de conceitos.

Trata-se, sobretudo, de mentalidade progressista e arejada sobre o devir, também de preparo, coisas que infelizmente a nova ministra demonstrou não possuir.


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