Contrato suspeito na Câmara de Natal pode favorecer parente de diretor

http://tribunadonorte.com.br/noticia/empresa-nao-funciona-em-endereco-registrado/216233

A TRIBUNA DO NORTE procurou a sede da empresa CSL Comércio e Serviços Ltda, que receberá R$ 564 mil para prestar o serviço de locação e manutenção de nove programas de computador à Câmara Municipal de Natal. O valor é referente ao contrato de uso por um ano. Pelo registro disponível no site da Receita Federal, a CSL funciona no centro de Natal, em um edifício instalado na rua João Pessoa. No entanto, a sala 404, do prédio Sisal, está desocupada há um ano.

Segundo informações de funcionários que trabalham no edifício, a sala foi comprada há um ano por uma pessoa chamada Dionísio Dias Aires de Carvalho. É no nome dele que está o registro na administração do condomínio. No entanto, segundo os funcionários, Dionísio comprou a sala como "investimento". As correspondências de despesas de manutenção, como energia e condomínio, são remetidas para a residência do proprietário da sala, em Nova Parnamirim.

Pessoas que trabalham no mesmo andar do prédio onde deveria funcionar a CSL atestam que há meses não veem qualquer pessoa na sala 404 do edifício Sisal.

A TRIBUNA DO NORTE também buscou o funcionamento da CSL Comércio e Serviços em um endereço de Nova Parnamirim, onde a empresa está registrada em sites de busca na Internet. No entanto, na rua Aníbal Brandão, no número identificado que seria o funcionamento da CSL, não há qualquer placa com informação sobre a empresa. Ontem à tarde, a TN esteve na residência e um homem, que não quis se identificar, se restringiu a dizer que a CSL havia mudado de endereço há três meses e estava funcionando em um sala do prédio Sisal, o que também foi desmentido pela visita feita pela reportagem.

A TN telefonou para o número identificado em um site de uma operadora de telefone fixo como sendo da CSL. A resposta foi que o telefone havia sido mudado. Uma hora depois, a reportagem fez um novo contato e dessa vez procurou pela pessoa chamada Liduína Maria Dantas Pessoa, que assinou o contrato com a Câmara Municipal.

Em um primeiro momento, quem atendeu ao chamado disse que Liduína "não estava" e, após um silêncio, emendou "essa pessoa não é daqui".

Contrato é no valor de R$ 564 mil

Em menos de um ano a Câmara de Natal firmou três contratos com a CSL Comércio e Serviços Ltda, empresa que não funciona no endereço registrado na Receita Federal. A negociação fechada mais recente foi no valor de R$ 564 mil. Por esse contrato, a empresa seria responsável por local e prestar manutenção de nove programas de computador voltados para folha de pagamento, recursos humanos, gestão de atividades legislativas e do plenário, gestão de processos, gestão de verba de gabinete, consulta e tramitação de projetos e leis, gestão da Escola do Legislativo, contabilidade e patrimônio.

O prazo para prestação do serviço é de um ano, no período de 19 de março de 2012 a 19 de março de 2013. Mas esse não foi o primeiro contrato firmado pela Câmara com a CSL. No dia 27 de abril de 2011, o Legislativo da capital potiguar publicou contrato no valor de R$ 25 mil com a mesma empresa. Na época, o extrato da negociação informou que houve dispensa de licitação. O contrato tinha como prazo de execução 90 dias. O objeto do contrato era o mesmo aplicado na nova negociação: "licença para uso de software".

A diferença é que ano passado, o custo mensal desse software (que não é especificado no extrato do contrato) foi de R$ 8.500. Na nova negociação, com o valor anual, o gasto mensal com o programa de computador será 47 mil. Após ter realizado o contrato com dispensa de licitação, em abril do ano passado, a CSL voltou a ser contratada pela Câmara.

No dia 21 de dezembro de 2011, foi assinado contrato no valor de R$ 39 mil com a empresa. O objeto da negociação foi "serviço de consultoria em tecnologia da informação". Na época o extrato do contrato não especificou o período do trabalho da empresa.

Além disso, contabilizando os R$ 57.600, firmados com a empresa de Dionísio Dias Aires de Carvalho, que tem o mesmo sobrenome de um dos sócios da CSL.

Contratos sugerem parentesco

O contrato firmado pela Câmara Municipal de Natal com a CSL Comércio e Serviços Ltda no valor de R$ 564 mil expõe também a negociação do Legislativo com pessoas que têm os mesmos sobrenomes: "Dias Aires de Carvalho". A empresa contratada por quase R$ 600 mil é de propriedade de José Everaldo Lopes, que detém 3,33% das ações; Liduína Maria Dantas Pessoa, sócia com 56,77% e Raimundo José Dias Aires de Carvalho, que possui 40%, segundo registro na Junta Comercial do Rio Grande do Norte.

Com o mesmo sobrenome "Aires Dias de Carvalho" consta um contrato firmado pela Câmara Municipal com a empresa Dionísio D A de Carvalho ME, que recebeu R$ 57.600 para o serviço de "atualização e manutenção do portal da internet da Câmara" pelo período de maio a dezembro de 2011.

A "coincidência" é que o proprietário da sala comercial onde deveria funcionar a CSL, instalada no prédio Sisal, é exatamente o proprietário da empresa que recebeu os R$ 57.600 para manter o portal da Câmara. Além disso, outro integrante da família Dias Aires de Carvalho" atua na Câmara Municipal. Francisco Gilson Dias Aires de Carvalho é chefe da Divisão de Recursos Humanos da Câmara Municipal. Ele foi nomeado através de ato assinado pelo presidente do Legislativo, vereador Edivan Martins, e publicado no Diário Oficial do dia 4 de janeiro de 2011.

Entrevista

Pedro Jorge Ferreira, diretor da câmara municipal

"Estamos avançando na parte tecnológica"

O diretor-geral da Câmara Municipal de Natal, Pedro Jorge Ferreira, disse que a CSL Comércio e Serviço Ltda já começou a prestar serviço na sede da Câmara, com a implantação de nove softwares. "O serviço já está sendo prestado e só pagarei o valor mediante a prestação do serviço", disse. Pedro Jorge ressaltou que não há nepotismo no fato de uma das sócias da empresa ser familiar do chefe de Recursos Humanos Francisco Gilson Dias Aires de Carvalho. Veja os principais trechos da entrevista.

Como a CSL Comércio foi informada dessa licitação da Câmara?

Foi feito um pregão presencial. Poderia ser o pregão eletrônico e aí teria recebido propostas de empresas onde apenas um software está a venda por mais de R$ 1 milhão. A Câmara não tem esse dinheiro. Preferi o pregão presencial porque ele dá mais participação a empresas locais. O pregão eletrônico participa empresa de fora e não dá assistência que você precisa em Natal.

Quantas empresas participaram do pregão presencial?

Participaram três ou quatro empresas locais e uma nacional.

Qual os contatos com a CSL?

Ela fez (em outro contrato) uma consultoria para ver as necessidades dos serviços que a gente precisava. Estamos avançando muito não apenas na parte física da Câmara, mas também na parte tecnológica, na parte humana, cargo e salário. Estamos avançando na parte de Tecnologia da Informação. A gente fez um pregão público, participa toda e qualquer empresa.

Mas quem é a pessoa que faz interlocução entre CSL e Câmara?

Assinamos esse contrato no dia 12 de março. O sistema já está funcionando. Minha preocupação maior foi em ter o serviço funcionando. Os aplicativos já começaram a funcionar. Temos mais de cinco técnicos atuando dentro da Câmara. Os serviços estão funcionando e quero que você compare o preço com o mercado.

O senhor sabe onde a empresa funciona?

Eu não saí da minha cadeira para saber onde a empresa funciona. Minha preocupação é que o serviço esteja sendo prestado. Você me levantou isso às 18h (de ontem). A gestora do contrato me informou que a empresa funciona no edifício Sisal. Como é empresa de serviço diferente de comércio, o serviço está sendo prestado. Minha preocupação é não estar comprando gato por lebre.

O senhor confirmou que a empresa prestou consultoria a Câmara. Não seria desequilíbrio o fato da empresa ter feito consultoria e agora ser contrata?

Não foi uma coisa escondida, foi pregão. A empresa prestou consultoria e participou. Não podia evitar a participação porque era pregão.

Um dos proprietários da empresa (Raimundo José Dias Aires de Carvalho) é familiar do chefe da Divisão de Recursos Humanos Francisco Gilson Dias Aires de Carvalho...

Mas eu já tenho parecer da procuradoria da Câmara e isso não é nepotismo. Ele (Francisco Gilson) está no cargo há mais de 20 anos. Só ocorre o nepotismo se a empresa for contratada pelo sistema de dispensa ou inexegibilidade com empresa que possua no seu quadro societário pessoa até terceiro grau com pessoa no cargo de direção. Francisco Gilson não tem cargo de direção, ele é de terceiro escalão.

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