@cfialho: Sobre blogues, erros e RTs

Carlos Fialho
No Novo Jornal

Dia desses, acompanhando minha linha do tempo na rede social virtual Twitter, deparei-me com uma informação repassada por outra pessoa. Tratava-se de um recado público dirigido a uma entidade, pedindo mais transparência em suas contas. O enunciado dizia algo como “Quem acha que a FIERN poderia dar exemplo de divulgar salários do funcionalismo dar RT aí!”

A sigla RT, comumente utilizada no Twitter significa “Retweet”, designando o ato de repetir uma mensagem postada ou, como dizem seus usuários, “tuitada” por outra pessoa. Dar RT é ecoar algo dito por outrem para que os seus seguidores (mais um termo particular do sítio) possam também ficar sabendo de algo que você julga importante compartilhar com eles.

A mensagem, como vocês podem ter notado, continha uma incorreção gramatical. Em vez de grafar o verbo “dar” no presente do indicativo e na terceira pessoa do singular: “dá”, o emissor optou pelo infinitivo: “Quem acha que… dar RT!” É um erro básico, mas compreensível, tolerável até, nesse meio tão dinâmico que é a internet, cheio de urgências escorregadias e corretores ortográficos maliciosos. Qualquer um, mesmo o mais intransigente defensor da norma culta, está sujeito ao equívoco instantâneo ao se aventurar pelas inebriantes veredas dos computadores conectados em rede e seus filhotes mais modernos como smartphones e tablets. No entanto, quando erros deste tipo são cometidos pela mesma pessoa repetidamente, não se pode mais colocar na conta da Internet.

O responsável pela mensagem, um conhecido blogueiro de Natal, comanda uma das páginas de maior audiência no Estado e, por diversas vezes, surgiram em minha linha do tempo do Twitter mensagens escritas por ele, sempre retuitadas por outras pessoas que sigo, nas quais se percebiam deslizes semelhantes. Certa vez, há alguns meses, tive curiosidade em ler uma informação no blogue mantido por ele, em razão de uma notícia postada por lá com exclusividade. A quantidade de erros em uma única postagem me deu o estímulo que precisava para nunca mais voltar a acessá-lo e nunca ter ganas de seguir o redator da publicação.

Por causa dos seguidos erros do blogueiro que atualiza um espaço de notícias virtuais, ou seja, tem no ato de escrever uma de suas atividades profissionais, quando percebi em minha tela o erro supracitado, fiz uma crítica ao flagrante desprezo que ele dispensa à língua. Teci o seguinte comentário: “O cara atualiza um blog de notícias e não consegue escrever sequer um tweet sem erros?” Não demorou muito até o titular do sítio saber que estavam se referindo ao seu trabalho de maneira não exatamente elogiosa. Numa reação natural dos seres humanos, não gostou e tentou se justificar.

Começou por dizer, de forma descontraída, que a gramática nunca foi o seu forte, que sempre sentiu dificuldades ante o vernáculo e que, segundo suas próprias palavras: “sou ruim demais em português”. Muito bem. Confesso que passei a admirar a coragem e força de vontade do homem que, mesmo sabendo de sua deficiência, logrou êxito em se tornar referência de comunicador na capital. Eu não teria essa ousadia. Sempre fui fraco nas matérias científicas, como Física e Química, por exemplo e, por isso, nunca me imaginei seguindo a carreira de físico ou fazendo da tabela periódica um importante instrumento do meu dia-a-dia. Por isso, é digno de nota que uma pessoa que não saiba se expressar corretamente por meio do português escrito resolva criar uma página de notícias atualizada regularmente.

O passo seguinte foi tentar atingir os eventuais críticos, chamando-os de “sabichões”, “intelectos” e dizendo que, se não quiserem ver seus erros, simplesmente não o seguissem, ignorando talvez, a possibilidade de a pessoa (no caso, eu) tê-lo lido por meio de um RT. Tal expediente me surpreendeu um pouco. Afinal de contas, o blogueiro em questão se autodefine como um crítico ácido e independente. Então, por que uma reação tão contrariada a uma opinião antagônica? Logo eu descobriria, a estratégia tinha um propósito maior: fazer um apelo indireto aos seus seguidores para que eles intercedessem a seu favor, partindo em sua defesa. Mais uma vez, mostrou-se eficaz o mestre da comunicação internética.

Não foram poucos os que se manifestaram em apoio ao jornalista autodidata. Entre os argumentos utilizados, posso destacar algumas ótimas pérolas da retórica em 140 caracteres. “É melhor falar certo escrevendo errado que falar errado escrevendo certo.”; “Sugira a quem critica seu português se mudar pra Portugal.”; “O termômetro do sucesso é a inveja dos descontentes.”, entre vários outros. As acusações de inveja, aliás, foram bastante recorrentes, como se esse fosse o único sentimento capaz de gerar uma crítica.

Entre os que elogiaram e incentivaram o profissional estão pessoas de notório saber, como o empresário Ênio Sinedino e os jornalistas Paulo Araújo e Rilder Medeiros. Respeito que pensem diferente de mim, mas realmente me incomoda que um comunicador que tem na palavra escrita o seu maior instrumento não guarde consigo a permanente preocupação de expressar-se de maneira a cumprir as regras de sua língua mãe. Para mim, os elogios que fizeram ao blogueiro no referido episódio, mesmo que motivados pelas melhores intenções, referendam sua maneira de atuar e abonam os seus erros. São, na verdade, elogios a sua ignorância. Se o defenderam movidos por laços fraternais que os unem ao blogueiro, na intenção de praticar uma boa ação para com um amigo, acredito que o efeito de tais manifestações condescendentes possa ser mais nociva do que um incentivo para que continue sim, mas tentando melhorar sempre, corrigindo as deficiências que ele próprio conhece.

Vejo com preocupação que o comunicador, mesmo cometendo tantos e frequentes erros, seja líder na blogosfera local, encontrando tamanha compreensão e cumplicidade por parte dos natalenses. A identificação e o elevado número de acessos e leitores dizem muito sobre o nível intelectual de nossa sociedade.

Quem concorda DÁ RT aí.

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