Dois ex-secretários da gestão de Luizianne Lins (PT) serão denunciados por repasses a OS da área de saúde

Investigação de OS contratada pela prefeitura de Fortaleza se assemelha à Operação Assepsia no Rio Grande do Norte.

Em O Povo

O promotor do Ministério Público Estadual (MPE) Ricardo Rocha vai entrar com uma ação civil pública contras dois ex-secretários de Saúde da Prefeitura de Fortaleza: Odorico Monteiro e Alexandre Mont'Alverne. O motivo seria o repasse de R$ 116 milhões, sem licitação, para o Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Apoio à Gestão em Saúde (IDGS). A transferência de recursos teria ocorrido durante as gestões da ex-prefeita Luizianne Lins.

A ação - que também terá como alvo os sócios do IDGS - irá se basear em uma investigação da inspetoria do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). Segundo Ricardo, não havia "qualquer razão" para a dispensa de licitação.

Além da devolução de todo o dinheiro, o promotor pede multa no valor de duas vezes os recursos destinados ao instituto, perda dos cargos públicos, dos direitos políticos e da capacidade de contratar com o poder público.

OS movimentou R$ 300 milhões repassados pela Prefeitura de Fortaleza entre 2008 e 2012

IDGS é sediado no anexo de uma igreja

Responsável por administrar os contratos de 5,3 mil terceirizados da área de saúde na Prefeitura de Fortaleza, o chamado Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Apoio à Gestão em Saúde (IDGS) funciona há pelo menos quatro anos, sob um manto de peculiaridades. Após movimentar mais de R$ 200 milhões em serviços com a Prefeitura de Fortaleza, o IDGS se vê às voltas com série de reclamações, prestes a ter contrato encerrado com a atual administração municipal.

Com escritório instalado em prédio anexo a uma igreja no bairro Joaquim Távora, o instituto se apresenta como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) e exige o pagamento, por parte da Prefeitura, de novo repasse milionário para suprir dívida com terceirizados. Embora aparentemente precário, o endereço de instalação do IDGS é resguardado por dois seguranças particulares, protegidos com armas e coletes, e minuciosamente cautelosos com quem visita o local.

Na reta final da gestão Luizianne Lins, a cobrança do instituto à atual administração municipal fez apontar que a Prefeitura firmou contrato com a organização em 2008, sem prazo exato para encerramento. Em dezembro do ano anterior, era realizada assembleia que definiria a constituição do instituto. Na ata da reunião, uma curiosidade: a assembleia que criava a organização sem fins lucrativos - que até então não deveria saber a quem serviria - foi realizada na sede da Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

No texto da ata, quem assina o documento como diretor-presidente do novo instituto é o enfermeiro e servidor municipal Messias Barbosa Lima, então coordenador de gestão hospitalar da Prefeitura de Fortaleza. Pouco depois, ele teve de renunciar da função “por exercer cargo público e não poder conciliar as duas atividades”, nas palavras do próprio Messias - hoje superintendente do maior hospital de traumas do Ceará, o Instituto Doutor José Frota (IJF). O mesmo IJF que agora tem 10% de seus funcionários vinculados ao IDGS.

Após a renúncia de Messias, assumiu a presidência do IDGS Reginaldo Alves das Chagas. Os serviços de Reginaldo à frente do instituto também duraram pouco. O então presidente da organização sem fins lucrativos teve de renunciar ao ser convidado pela Prefeitura a assumir o cargo de coordenador de Politicas de Saúde da SMS. Depois dele, pelo menos três pessoas já passaram pelo comando do IDGS nos últimos três anos.

Nova composição
Os mais recentes registros do Diário Oficial do Município apontam Silvânia Palmeira Alves Fernandes como a diretora-presidente do IDGS. O POVO tentou contato com Silvânia ao longo da semana, porém, na sede do instituto, funcionários informaram que a atual presidente do órgão é Maria José Costa. Em primeiro contato com a reportagem, uma advogada da Oscip chegou a dizer que não conhecia “nenhuma Silvânia Palmeira”. Em segundo momento, disse que Maria José substituía Silvânia “interinamente”. Não soube explicar, no entanto, porque Silvânia estava afastada da função.

Para o promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Público Ricardo Rocha, as especificidades apuradas pelo O POVO apontam para “um indício de conluio” na relação entre o IDGS e a Prefeitura de Fortaleza.

Procurada pelo O POVO, a Prefeitura disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que o IDGS é uma instituição independente, sem qualquer relação com gestor ou ex-gestor vinculado à atual administração municipal.

Por quê
O nome do Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Apoio à Gestão em Saúde (IDGS) ganhou notoriedade nos últimos dias com a cobrança de atrasados por parte de terceirizados na área de saúde da Prefeitura.

Saiba mais
Movimentação de repasses da Prefeitura de Fortaleza ao IDGS:Segundo os dados do Portal da Transparência do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), o primeiro repasse da Prefeitura de Fortaleza ao IDGS totalizou R$ 720 mil, em setembro de 2008. O último repasse disponibilizado no portal data de 23 de julho de 2012. O valor é de R$ 1,6 milhão. Em março deste ano, o IDGS recebeu o mais alto montante da Prefeitura: os valores ultrapassam R$ 25 milhões em um único mês. Ao todo, a Prefeitura de Fortaleza repassou ao IDGS, até julho deste ano, R$ 228 milhões.

Quem é terceirizado?
O IDGS tem funcionários prestando serviço em hospitais, Serviço de Atendimento Móvel de urgência (Samu), postos de saúde e Centros de Atenção Psicossocial (Caps). Cerca de 10% dos funcionários do IJF são vinculados ao IDGS. O Samu tem 50% do seu efetivo ligado ao instituto; 90% dos funcionários do Caps têm vínculo empregatício com o IDGS.

O que é uma Oscip?
É uma ONG criada por iniciativa privada, que obtem certificado emitido pelo poder público federal ao comprovar o cumprimento de requisitos, especialmente aqueles derivados de normas de transparência administrativa. Podem celebrar com o poder público os chamados termos de parceria, que são uma alternativa aos convênios para ter maior agilidade e razoabilidade em prestar contas. A lei que regula as Oscips é a de nº 9.790, de 23 março de 1999.

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