Protestos contra a Copa não são apartidários: são, na verdade, um "Fora PT"

Por Wagner Iglecias
No Jornal GGN
Neste sábado (25/01) tivemos a abertura oficial da temporada de protestos 2014. Em várias cidades do país foram convocadas manifestações para o ato “Não vai ter Copa”. Em muitas o comparecimento de público ficou bem abaixo do esperado, como aliás apressaram-se a divulgar os setores simpáticos ao governo. Mas em outras não. Foi o caso de São Paulo. Pelo menos mil pessoas concentraram-se na Avenida Paulista.

Bandeiras de variadas cores, faixas com dizeres em português e inglês, discursos e palavras de ordem diversos. Em comum, as provocações contra a polícia e os gritos contra Dilma Rousseff. Décadas de péssima ou nenhuma educação política nas escolas dão nisso. Setores de juventude branca, de classe média, chamando a polícia de assassina e bradando: "E essa Copa é uma balela, desculpa pra MATAR o povo preto na favela...ei Dilma, vê se me escuta, a Copa vai ser luta". Claro, num país em que a esmagadora maioria das pessoas não sabe a diferença entre um deputado e um vereador, natural achar que as polícias estaduais são de responsabilidade do governo federal.

Mais adiante a manifestação dobrou a Brigadeiro Luís Antônio e desceu em direção ao centro. A Prefeitura, comandada pelo PT, não passou ilesa. Em frente ao prédio a massa entoou um “Ei, Haddad, vai...”. Logo Haddad, que quando ministro não exerceu a pasta dos Esportes, e é prefeito há apenas um ano, sendo que a escolha de São Paulo como sede do Mundial ocorreu em maio de 2009!!!

O evento foi um melting pot de gente na rua, como em junho passado. Gente de luta social, ligada a partidos de extrema-esquerda, além de black blocs, anarquistas, curiosos e também pessoas que parecem recém saídas do shopping, da academia de ginástica e do playground, lugares cuja finalidade não é ensinar política, obviamente. Em que pese toda essa diversidade, no fundo fica patente certo desconhecimento em relação ao funcionamento das instituições, as competências e atribuições de cada ente federativo. Parece ser tudo “culpa do governo” e atribui-se à presidência da república praticamente todos os males existentes no país.

Os manifestantes em São Paulo gritaram contra o gasto considerado excessivo com os estádios para a Copa. Se são excessivos, ou se as obras foram super-faturadas, estão certíssimos em protestar. Motivos outros para isso também existem, como as remoções de famílias pobres das áreas das obras, os acidentes com operários que trabalharam na construção das arenas e as concessões legais feitas à FIFA. Além do que protestar contra o Mundial deve ser encarado como um ato absolutamente normal num regime democrático como o nosso, onde convivem as mais diferentes opiniões sobre os mais diversos assuntos de interesse público.

Mas é curioso como não se ouviu protestos em relação às denúncias que apontam para corrupção de bilhões de reais nas obras do metrô da capital paulista, por exemplo. É um tema que não deixa de ter relação com as tais obras de mobilidade urbana que governo federal, governos estaduais e prefeituras prometeram todos esses anos à sociedade por ocasião da Copa. Obras que até o momento não foram percebidas pela população, ao mesmo tempo em que nossas cidades se tornam piores a cada dia. Com uma agenda tão focada em Dilma Rousseff, por mais que não queiram, essas manifestações anti-Copa começam mal, e acabam passando a impressão de serem motivadas por certa indignação seletiva.

Por fim, muita gente que não sai às ruas está manifestando apoio aos protestos. Mas claro, desde que sejam sem vandalismo e apartidários. Acompanhando o que se viu hoje em São Paulo, a impressão é de que apartidários é o que eles menos têm sido. Apesar de tantas bandeiras e palavras de ordem, pelas mais variadas motivações, sinceras ou nem tanto, no fundo tudo parece se resumir a um partido e uma ideia: FORA, PT!

Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e Professor do Curso de Graduação em Gestão de Políticas Públicas e do Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da USP.

Comentários

Unknown disse…
Ora, se os partidários petistas não forem às ruas protestar, os "apartidários" aproveitarão o bonde vazio.
Dia 20/06 fiz-me presente na passeata de Recife e, para minha surpresa, defrontei-me com uma multidão de esteriotipizados médioclassistas. Frustação total. Achava que os que deveriam estar lá, não estavam.
Dias passaram-se e, refletindo sobre minha frustação naquele ato, tornei a frustar-me. O motivo foi por convencer-me que aqueles medioclassistas esteriotipados tinham razões concretas para estar alí expressando indignação.
Bem. Se eles tinham, imagina todo o contingente de pobres do Brasil.
E o pior. Quem mais deveria estar, não estava.
Imaginem se a indignação dos injustiçados, que sofrem diariamente a negação de acesso aos direitos constituídos, eclodir. No dia que isso acontecer, não sei quem se frustará.