Facismo moderno, mais um capítulo

Ao ler o texto que republico abaixo, lembrei-me do que escreveu Marcelo Semer no post que publiquei aqui.
A mídia tradicional, especialmente a Folha de S. Paulo, está dando cada vez mais espaço a ideias facistas e reacionárias, pretensamente em nome da liberdade de expressão.  É o caso de Luís Felipe Pondé, que disse em sua coluna há poucos dias que toda mulher gosta de ser tratada como objeto.
O caso de Pondé, que provavelmente tem espaço para publicar coisas estúpidas assim em nome da liberdade de expressão, me fez lembrar o caso da psicanalista Maria Rita Kehl que escreveu o texto Dois pesos... no dia 02 de outubro de 2010, véspera da eleição, em sua coluna no Estadão e foi demitida por defender o governo Lula nesse artigo.
Pois foi na Folha que saiu mais um artigo que representa perfeitamente o pensamento reacionário moderno.  Escreva seu desagrado para a autora: o e-mail vem abaixo do texto:



Empregadas, mais um capítulo

Nina Horta

Leitores, por favor, ajudem a responder: Por que se foram as boas empregadas dos bons patrões?



Como todos se lembram da fase em que existiam empregadas! Acordei leitores de todas as idades e lugares. Claro que estou me lembrando só das doçuras de um tempo em que éramos empregados, mas também tínhamos empregadas, o que possibilitava coisas na vida que não seriam possíveis nos dias de hoje. 

Dona Marta, por exemplo. A passadeira ficou conosco uns 30 anos. Na menopausa virou cleptomaníaca. Com o dinheiro que roubava, comprava coisas para meus próprios filhos que ficavam furibundos, pois a mesada deles ia toda embora em pijaminhas de calça curta. 
Tinha um ciúme do emprego que não dava para acreditar. Uma vez teve que ser mandada embora. Uma americana veio morar um ano conosco. Ela se recusou a lavar a roupa dela. Não lavo e não lavo. Foi um constrangimento, teve que sair. Dona Marta iria nos fazer falta. Afinal, lavava e passava com perfeição, e era uma inglesa, só conversava sobre tempo e flores. Pois, foi embora.

Quando eu chegava, sentia certo ambiente diferente, uma risadinha aqui e outra ali, mas não descobria a causa. A arrumadeira nunca se queixou do trabalho extra e era quem tinha mais sorrisos amarrados na boca. Adivinharam. Dona Marta nunca foi embora. Chegava depois de mim e saía antes, não recebia salário. Fingiu que nada havia acontecido e continuou tudo como dantes no quartel de Abrantes. 
Daí chegou a época em que só se arranjava as piores empregadas. Ninguém mais sabia cozinhar, ler, escrever, atender telefone, espanar. 

A última, vinda do sertão, custei a perceber, falava outra língua. Substantivos que eu usava ela não sabia o que queriam dizer. E vice-versa. Então, calava. As palavras mais básicas, como pires, manteigueira, lichia (ah, aquela jaquinha?), água com gás, maionese, páprica, purê, ela armazenava para o esclarecimento final, no dia em que eu juntasse o objeto à palavra. Não nego que era inteligentíssima, vá você trabalhar na casa de um japonês que não fala português.

Aumentaram-se os ordenados. E vieram aquelas com as quais eu menos conseguia conviver. As novas ricas, que tomavam emprestado o status das patroas. Sabiam nomes de políticos, celebridades, peruas. Todas as receitas delas levavam leite condensado e nozes. 

Ficavam arrepiadas ao ter de passar uma camisola de cambraia velha, tão fresquinha, já puída, um pijama de flanela xadrez de estimação da patroa nova. Faltavam-lhes referências para qualificar pessoas e por pouca informação classificavam as visitas pelos carros. 

As esnobes sem causa. Falta falar na empregada perfeita, melhor que você em tudo, a tenho-saudade-da-Bahia, a estudante-de-direito, e outras. É de chorar. 

Aprendemos inclusive a mudar o jeito de comer. Picadinho passou a ser pitéu de festa de casamento. Quem chega do trabalho e faz arroz, feijão, carne, farofa, banana frita, verdura e salada? Da próxima vez, com ajuda dos leitores, descobriremos o que aconteceu com aquelas moças tão prendadas. Por que se foram? Não vale falar da patroa ruim e da empregada ruim também. Por que se foram as boas empregadas dos bons patrões, é a pergunta. 

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