O abandono da base política

Quando ouço as posições e falas de Dilma e do governo sobre faxina ética no governo, confesso que me assusto.  Visivelmente a presidenta quer assumir um lugar discursivo, definido pela Comunicação de seu governo, a fim de deixar sua própria marca junto à opinião pública.  Além disso, parece tentar resgatar a fala em defesa do comportamento ético, anterior à crise do Mensalão.  Só que me lembro também da vassoura de Jânio Quadros.  E isso é de temer, porque na prática e no discurso, o governo em busca de viabilidade caminha a passos largos na direção de repetir conservadorismos udenistas.  À direita, artificiais, moralistas e arriscados ao progresso avanço em áreas sensíveis dos direitos humanos - como já deu provas na questão da homossexualidade e da punição da homofobia.
Escrevi sobre isso dias atrás neste texto.
Por isso, é interessante a leitura atenta do que diz abaixo Luís Nassif.

Não estão claros, ainda, os movimentos políticos da presidenta Dilma Rousseff.
Em breve ela começará a enfrentar uma oposição inédita das centrais sindicais. O afastamento da Força Sindical é apenas um primeiro sinal. O sinal mais preocupante será da CUT e dos sindicatos filiados a ela. A continuar a dinâmica política atual, é questão de tempo.
Começou com estranhamento, em função da aproximação de Dilma de seus antigos adversários. Continuou com mágoas, pelo que consideram falta de atenção continuada. E está transbordando para raiva.
Um preço que o governo Dilma estará pagando de graça.

Movimentos iniciais
Ela foi eleita por uma base de apoio dos sindicatos, movimentos sociais, blogosfera, base criada por Lula e ampliada pela adesão de grandes grupos e da classe média satisfeita com os rumos da economia.
Teve por adversários, ferozes, o tea party de José Serra, a chamada opinião pública midiática, embalados pela velha mídia, manipulando preconceitos, espalhando boatos, recorrendo a um denuncismo inédito na moderna história política brasileira - similar ao modelo Rupert Murdoch.
Foi uma guerra épica, que deixou mortos e feridos de lado a lado.
Eleita, tendo a maior base de apoio parlamentar que um presidente já dispôs, tratou de se aproximar dos adversários e de reduzir a fervura política - no que agiu corretamente. Tem que investir em ser a presidente de todos os brasileiros.
Aí avançou o sinal.
Para mostrar que não era a "terrível" Dilma retratada pela mídia, afastou-se dos sindicatos. O Plano Brasil Maior, lançado ontem, conseguiu apresentar um pacto de competitividade do qual as centrais sindicais sequer participaram.
É um retrocesso inédito. Nem Fernando Collor foi tão longe. Com toda resistência que provocava nos trabalhadores, ensaiou o primeiro pacto produtivo da história brasileira, com as câmaras setoriais da indústria automobilística, conduzidas pela Ministra Dorothea Werneck, Lá, pela primeira vez - vindo de um governo ferozmente liberalizante - se concluía que a preservação da produção nacional era de interesse direto de empresários e trabalhadores.
A detente abriu espaço para programas de qualidade, para diversos pactos ao longo dos anos 90 que modernizaram as relações trabalhistas no país.
Denúncias e denuncismo
Dilma não apenas se distanciou dos sindicatos, mas passou a endossar denúncias da velha mídia.
É evidente que denúncias fundamentadas precisam ser apuradas e as distorções resolvidas. Mas há maneiras e maneiras. Há informações de investigações em curso na Polícia Federal que justificariam a razia ocorrida no Ministério dos Transportes. Em vez de uma ação objetiva, discreta e fulminante - que carcaterizaria uma vitória do governo - permitiu-se um show midiático que vai estimular a volta do denuncismo.
A lógica é simples. As denúncias fazem as primeiras vítimas - mas num alarido que pega gregos e troianos nas mesmas acusações. Depois, abre espaço para o festival de mágoas dos demitidos. O ápice de uma denúncia midiática é a demissão do acusado. O jornalismo brasiliense vive em função de dois sonhos: derrubar autoridades (primeiro secretários, depois ministros até o auge de presidentes) e pacotes econômicos.
Ontem o Jornal Nacional dedicou maior tempo ao desabafo do ex-Ministro Alfredo Nascimento do que ao Plano Brasil Maior. Na sua última edição, Veja abriu amplo espaço a um sujeito demitido da Conab por corrupção explícita, para que pudesse "denunciar" seus colegas que o demitiram, sem a necessidade de apresentar provas. Época enceta uma campanha contra a Agência Nacional de Petroleo em cima de informações que lhe foram passadas pela própria ANP dois anos atrás.
A comunicação do governo está restrita ao mundo das sucursais brasilienses; os contatos de Dilma com o mundo das associações empresariais - que tem e devem ser consultadas, mas não com exclusividade.
O que parecia um movimento tático - de se aproximar dos adversários e diminuir a fervura - a cada dia que passa ganha contorno de mudança estrutural do leque de alianças. Correta ou não, é essa a percepção cada vez mais forte em setores sindicais e do leque de aliados da campanha de 2010.
Lula costumava caçoar da ingenuidade do "Palocinho" (como o chamava), que sempre acreditava que ganharia o título de sócio remido do clube principal.
No final do ano passado, Palocci garantiu a Lula que Veja estaria preparando uma edição finalmente reconhecendo os méritos de seu governo. Na semana anunciada, a capa em todas as bancas: "O governo mais corrupto da história".

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