Provita: Cidadania ameaçada

Da Isto É
Através do Congresso em Foco

Experiências recentes mostram que os países que conseguiram enfrentar para valer a corrupção e o crime organizado tinham um forte e eficiente programa de proteção a testemunhas. Na última semana, quando milhares de pessoas foram às ruas clamar por uma faxina ética no Brasil, ISTOÉ teve acesso a uma série de documentos que revelam o quanto o nosso Programa de Proteção a Testemunhas (Provita), criado em 1999, e anualmente comemorado pelo governo, é falho e inconfiável. Os papéis, já encaminhados ao Palácio do Planalto e à Secretaria Nacional de Direitos Humanos pela Defensoria Pública da União (DPU), mostram como os objetivos do Provita estão sendo desvirtuados pela burocracia e descaso das autoridades. Há falhas na garantia dos sigilos das testemunhas e ocorre até o vazamento criminoso de informações sobre suas localizações.

Os documentos narram a incrível história de um empresário mineiro, cujo codinome adotado pela DPU é Antônio Maria. Casado e pai de dois filhos, ele ajudou a desvendar um esquema de corrupção no Norte do País envolvendo políticos, promotores, policiais e juízes. Depois de fazer as acusações, contar o que sabia e ser admitido no Programa de Proteção a Testemunhas do Ministério da Justiça, o empresário teve sua identidade, seu paradeiro e até a rotina diária da família entregues por quem deveria protegê-lo a pessoas ligadas aos por ele denunciados. Acabou sendo barbaramente torturado e hoje vive escondido em um hotel sem saber o que fazer no dia seguinte. “Além da tortura, me persuadiram a não mais testemunhar ou sequer voltar para o Norte”, relata Antônio em carta de cinco páginas, acompanhada de documentos confidenciais, entregue pela Defensoria ao Palácio do Planalto na terça-feira 6.

Ao denunciar o episódio ao Provita de Pernambuco, o Gajop (Gabinete de Assessoria Jurídica das Organizações Populares), ONG executora local, solicitou audiência com a cúpula da Secretaria Especial de Direitos Humanos. Estavam presentes à reunião o secretário-executivo da SDH, Ramais de Castro Silveira, e a coordenadora-geral de Proteção à Testemunha, Luciana Garcia, entre outras autoridades. O caso foi comunicado à ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário, e um grupo de trabalho passou a estudar soluções alternativas para garantir a vida do empresário e de sua família. Uma análise preliminar concluiu que o grupo denunciado por Antônio Maria integraria uma rede com contatos em todo o País, e que a única saída seria enviá-lo para o Exterior. A promessa de transferência foi formalizada num ofício confidencial enviado por Luciana Garcia à Defensoria Pública da União no último dia 9 de junho. Dentre os compromissos assumidos pela coordenadora-geral do programa está a “emis¬são de passagens aéreas para deslocamento para o país de destino, no prazo máximo de 17 de junho”.

O problema é que, passados quase três meses, nada aconteceu. O Gajop, em reunião com o Conselho Deliberativo do Provita, alegou que não havia dinheiro para a operação. Cerca de R$ 60 mil foram consumidos até agora em diárias do hotel, onde o empresário e a família vivem agora acuados, sem nenhuma proteção especial. Os filhos tiveram que deixar a escola e devem perder o ano letivo. Antes, foram obrigados a passar 45 dias nas dependências do Serviço de Proteção ao Depoente da Polícia Federal, local que serve de triagem e no qual só deveriam permanecer por 20 dias, segundo a lei. Para Antônio Maria, a situação chegou ao limite. Na denúncia à Defensoria, ele explica que a ausência de uma definição sobre o caso vem causando “sérios danos psicológicos”, além de óbvia indignação.

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